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domingo, 19 de março de 2017

Famosa blogger portuguesa é o próximo Jean Valjean em Londres


Seguindo a irritante onda vigente de títulos parvos que tentam atrair leitores, e que só hoje fiquei a saber que se chama clickbait — sempre a aprender —, palavra de honra que foi o título que me veio imediatamente à cabeça há quatro ou cinco dias, quando vi o casaco que blogger muito conhecida mostrava. Ou isso ou comprou o casaco à produção de Les Misérables.

Para quem não saiba, Jean Valjean é o protagonista do meu tão amado Les Misérables, recordista absoluto entre os musicais mais tempo em palco, já vai em 31 anos em Londres. Em todas as produções mundiais, e têm sido incontáveis, o guarda-roupa é sempre igual, seja em Sydney ou em Copenhaga.

E que não faria eu pelos meus escassos estimados leitores? Só por vós e para vós, dei-me ao trabalho de alojar no YouTube este esplêndido documentário que conta a história de como tudo começou, naquele longínquo 8 de Outubro de 1985, documentário que há mais de vinte anos me foi oferecido por um querido amigo que já não está entre nós.  De cada vez que John Caird intervém, assaltam-me os remorsos por não lhe ter saltado ao pescoço em agradecimento, daquela vez que o vi a jantar no The Ivy, por tradição o restaurante a que, quem é do meio, vai a seguir ao teatro. Convém marcar com bastante antecedência, ou ficar num hotel com um concierge daqueles mesmo bons.

A ver se se animam e, caso nunca tenham visto, não perdem Les Misérables numa próxima ida a Londres. E depois venham cá contar, sim?


Bamda sonora (ali em cima à direita): One Day More, o glorioso final do I Acto, quando já estou com os olhos inchados de tanto chorar.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Músicas no meu iPod: Quinze Ans

Não consigo descobrir de que ano é esta música que hoje, no regresso a casa, veio revisitar-me, e que ouvi três vezes de seguida. Suponho que seja de 1974 ou 1975, mas só a conheci mais tarde, já em 1982, quando o Pedro Oom, no Stone's, ma gravou numa célebre cassete que, se ainda for deste mundo, vive algures em Barcelona.

Lembro-me de nessa noite de 1982, uma sexta-feira já sábado, ter chegado a casa de madrugada e ter ficado no escuro, já deitada, a ouvir baixinho a cassete do Pedro, a tal que viria a dar origem a um presente de gratidão meu, Goodbye and Hello, de Tim Buckley, que ele não conhecia. A namorada (hoje mulher) não gostou nada e veio pedir-me explicações, achando que eu estava a atirar-me a ele. Tão bem devo ter-me explicado que a partir daí passámos a ter a mais cordial das relações.

A melodia simples mas belíssima e a soberba letra conquistaram-me de imediato: o primeiro amor  e a revelação da sexualidade vistos pelos olhos de um adolescente, perturbadores, cheios de descobertas, de medos, de incertezas, de dúvidas. E julgo que o primeiro amor de muitos homens tenha passado por toda esta confusão de sentimentos.

O que eu não sabia nem podia saber à época era que este senhor, Claude-Michel Schönberg, o cantor e autor, viria a ser, anos mais tarde e de parceria com Alain Boublil, o responsável pela obra que me abriu as portas para o mundo mágico dos grandes musicais: o meu muito amado Les Misérables, de que já muito falei aqui.

E concordemos que a passagem dos anos foi amável com ele, hoje um homem bem mais interessante (a imagem é recente).

A quinze ans, je n'avais pas compris
Que pour elle "non" voulait dire "oui"
Je n'osais pas aller plus loin
Que le rempart de ses deux mains
Qui m'invitait par un refus
A faire des choses inconnues

A quinze ans je ne savais pas
Que la nuit, le corps en émoi,
Elle rêvait de douce souffrance
Au cours d'un viol sans conséquence
Dont le coupable aurait la chance
D'avoir le sourire et la voix
D'un héros vu au cinéma

Mais n'allez pas croire qu'à quinze ans
J'étais totalement innocent
Car l'imagination en feu
Je vivais des jeux amoureux
Que j'avais retenus par cœur
Dans des romans, comme un voleur

Les femmes pour moi c'était clair,
Mais les filles restaient un mystère

A quinze ans, j'étais très timide
Même avec les plus insipides
Et j'avais recours à la ruse
Pour pouvoir de façon confuse
Effleurer le bout de ses seins
Espérant qu'elle ne dirait rien

Avec le temps, les expériences
M'ont donné un peu d'assurance
Pourtant je sais que chaque fois
Que je tiens une femme dans mes bras
Je me sens comme un débutant
Qui entre en scène en hésitant
Et j'ai le trac
Comme à quinze ans.





sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

T.P.C.

A saber de cor e salteado até 20 de Janeiro.

Apesar de conhecer apenas uma música, o obcecante If I Loved You, nesta magnífica versão de Barbra Streisand no seu The Broadway Album (ao que parece muito diferente do original...), sei que vou dar conta do recado!

Carousel, de 1945, foi votado pela revista Time como o melhor musical do século XX (Sãozinha, foram os versaletes possíveis, desculpe). Muito bom entendido — a grande maioria, para dizer a verdade — acha que Gypsy é o melhor musical de sempre. As letras são de um certo génio chamado Stephen Sondheim... Vi Gypsy, este Gypsy (espreitem, ainda estará em cena com Ela até Março, se forem a Nova Iorque até lá e se conseguirem arranjar bilhetes... boa piada!), a 1 de Setembro deste ano com a gigantesca Patti LuPone, um monstro de palco, actriz e cantora. Patti LuPone é sobrinha-bisneta da mítica Adelina Patti (até nos meus amados Maias há duas referências a ela). Patti LuPone é a minha Fantine perfeita, o papel foi criado por ela, e só ela consegue fazer-me chorar na música que é um marco no meu crescimento musical, I Dreamed a Dream. Só Deus e o Vítor sabem o que chorei quando a ouvi pela primeira vez, numa noite de Primavera adiantada de 1995. Porque foi pelas mãos dessa música, que foi para mim um coice poderoso, que transpus timidamente o portão para um jardim secreto e magnífico, há treze anos: o dos musicais. Dificilmente (nem em Leonard Cohen, provavelmente) encontraremos letras mais poderosas, mais acutilantes, mais desgarradoras. Quando comecei neste blóguio a etiqueta Les Misérables, o Vítor autorizou-me expressamente a dizer aqui que tinha sido com essa obra que para ele tudo começara: a maravilhosa viagem que nos faz querer conhecer sempre mais e mais, e ainda mais. Ele vai sempre uns passos, muitos passos adiante, a puxar-me pela mão. Descobre e quer partilhar, diz que eu tenho de conhecer. Sim, títulos e sinopses até me são familiares, leio suficientemente. Mas títulos e sinopses não são a obra viva, como confio cegamente ponho-me a aprender (T.P.C.). O resultado final são os momentos em que vemos juntos, lado a lado, esta ou aquela obra e nos acotovelamos mudamente e choramos ou rimos exactamente nos mesmos momentos.

Voltemos a Patti LuPone, a primeira Fantine de Les Misérables. E ao seu incomparável I Dreamed a Dream. A minha viagem começou aqui, com ela e com Les Misérables. A minha viagem só acabará quando eu acabar, porque hei-de querer conhecer sempre MAIS.

[Fantine is left alone, unemployed and destitute]
— nota à margem




FANTINE:
There was a time when men were kind
When their voices were soft
And their words inviting
There was a time when love was blind
And the world was a song
And the song was exciting
There was a time
Then it all went wrong

I dreamed a dream in time gone by
When hope was high
And life worth living
I dreamed that love would never die
I dreamed that God would be forgiving
Then I was young and unafraid
And dreams were made and used and wasted
There was no ransom to be paid
No song unsung, no wine untasted

But the tigers come at night
With their voices soft as thunder
As they tear your hope apart
And they turn your dream to shame

He slept a summer by my side
He filled my days with endless wonder
He took my childhood in his stride
But he was gone when autumn came

And still I dream he'll come to me
That we will live the years together
But there are dreams that cannot be
And there are storms we cannot weather

I had a dream my life would be
So different from this hell I'm living
So different now from what it seemed
Now life has killed the dream I dreamed.

Banda sonora: Patti LuPone - I Dreamed a Dream
(click to listen)

terça-feira, 4 de novembro de 2008

I Les Misérables - VI

O primeiro disco desta edição especial é, claro, o histórico concerto do 10.º aniversário, de que tenho posto aqui excertos. Reuniu aquilo a que passou a chamar-se o dream cast (discordo em absoluto quanto à escolha de Ruthie Henshall como Fantine, a senhora irrita-me, com aquela maneira de cantar muito explicadinha, como quem está a debitar uma lição na escola primária — cá para mim, Patti LuPone não estava disponível).

O segundo disco é um fabuloso documentário, Les Misérables Stage by Stage, em que é contada a criação do musical por Claude-Michel Schönberg e Alain Boublil, a história da sua passagem para o palco, em Londres, pelas mãos de Cameron Mackintosh, e da sua posterior difusão pelo mundo, com produções em (pelo menos) 35 países, passando por Israel, Japão, Islândia, Austrália, República Checa ou Hungria...

Tive a sorte de o ver ainda antes dos meus primeiros Miseráveis em palco, o meu amigo João N., que tinha a abençoada mania de gravar tudo e mais alguma coisa na televisão, tinha-o caçado havia coisa de um ano na RTP 2 e levou-mo, naquela fase em que eu só ouvia Miseráveis de manhã à noite.

Faltava apresentar Javert, o inspector da polícia, o eterno perseguidor de Jean Valjean (que no vídeo de Les Misbarack surge como John McCain). Eis Philip Quast, que não foi o criador do papel, mas que toda a gente concorda ser o maior Javert de sempre. Aqui fica ele em Stars, uma das mais belas músicas de Les Misérables.

Para ouvirem o grande Philip Quast, é favor parar a música lá em cima, que é a do original de Londres, cantada por Roger Allam, que criou o papel.







segunda-feira, 3 de novembro de 2008

I Barack Obama


Foi para vos apresentar a pérola abaixo que andei uma semana a massacrar-vos com Les Misérables. O vídeo recebeu o título de Les Misbarack. A música é esta, One Day More.

Cenário: quartel-general da candidatura de Barack Obama.
Data: 3 de Novembro de 2008. Hoje. One Day More...

A loirinha (Cosette) e Marius trocam as suas juras de amor; a menina de óculos é Éponine, a sofrer. Pormenor delicioso: John McCain aparece como Javert, o terrível Javert, o vilão; Sarah Palin é Mme. Thénardier (senhora muito jeitosa, como já devem ter percebido).



domingo, 2 de novembro de 2008

I Les Misérables - V

Chegámos finalmente onde eu queria, a esta música: One Day More. Que corre o sério risco de ser a minha favorita na admirável construção musical que é Les Misérables. Ou talvez não... que o capricho momentâneo vai-me fazendo eleger ora uma, ora outra, como as preferidas. Seja como for, é uma música extraordinária.

É o final do primeiro acto. Tudo fica em suspenso. Para todos. Jean Valjean é novamente perseguido por Javert, que lhe encontrou o rasto. Marius e Cosette acabam de se apaixonar. Éponine sofre. Os estudantes constroem a barricada... Tudo é uma imensa interrogação. O dia seguinte será decisivo. One Day More...

O retrato à esquerda, se bem que péssimo, é-me especialmente querido. Eu e o Vítor em Nova Iorque, Outubro de 2001. Fomos rever Les Misérables, claro. Um mês depois do horror que foi o 11 de Setembro, toda a gente a proclamar-nos doidos por irmos aos Estados Unidos naquela altura (já tinha começado o pesadelo do antraz, as malas no aeroporto foram-nos revistadas por polícias enluvados). Fomos, e ainda bem que fomos. We came in the most uncertain hour, como canta Paul Simon numa certa música cá muito das minhas obsessões. Tinha passado apenas um mês, a cidade ainda estava em estado de choque. Em volta do Ground Zero ainda se multiplicavam velas acesas e fotografias com apelos desesperados. MISSING! Aquela cidade, a maior do mundo, sentia-se de repente fragilizada, o amanhã era uma coisa incerta. One Day More...



I Les Misérables - IV

Jean Valjean é a personagem central de Os Miseráveis. Jean Valjean somos todos nós, e isso é bem a medida da genialidade de Victor Hugo. Jean Valjean, para mim, será sempre Colm Wilkinson. Nunca o vi em palco, tremenda mágoa, mas é ELE.

Quando a história começa, Jean Valjean cumpre trabalhos forçados há dezanove anos por ter roubado um bocado de pão. Eram outros tempos, estava-se em plena Revolução Industrial (alguém por aí terá lido Sem Família, de Hector Malot?), a propriedade era o valor maior, contava mais do que a vida humana.

Dezanove anos depois dão-lhe liberdade. Javert, que virá a ser a sua Némesis, adverte-o de que já não tem um nome, é só um número: 24601.

Poderia ter sido isso, poderia ter sido assim. Mas Jean Valjean encontra o bispo. E o bispo (lembram-se? Apaixonei-me perdidamente por ele no primeiro capítulo do livro, na minha adolescência) salva-o. Saído da cadeia, Jean Valjean é escorraçado por todos, todas as portas se lhe fecham. Acaba por encontrar guarida em casa do bispo, onde passa a noite. O bispo vive em enorme pobreza, tudo o que recebe é imediatamente dado aos que têm ainda menos. Mas tem dois bens preciosos, que a irmã e a criada cuidam com desvelo amoroso: dois castiçais de prata (provavelmente o bispo ainda não tinha olhado para eles com olhos de ver, ou já os teria convertido em ajuda para os necessitados). Jean Valjean rouba os castiçais. A polícia prende-o e leva-o à presença do bispo, o legítimo proprietário. O bispo mente com toda a firmeza: há ali um engano, os castiçais foram por ele oferecidos a Jean Valjean. A polícia parte. O bispo diz a Jean Valjean que acaba de lhe comprar a alma: desse dia em diante Jean Valjean é um instrumento de Deus e da Sua infinita bondade (podem ouvir aqui).

«But remember this, my brother
See in this some higher plan
You must use this precious silver
To become an honest man
By the witness of the martyrs
By the Passion and the Blood
God has raised you out of darkness
I have bought your soul for God!»


Assim será. Jean Valjean, todo revolta, debate-se contra o amor que não esperava. Mas o amor é mais forte, o amor opera o milagre. Jean Valjean muda. Encontramo-lo anos mais tarde, sob o nome de M. Madeleine, próspero proprietário, presidente da câmara. E justo, benevolente. Os castiçais de prata acompanham-no sempre, como lembrança da figura redentora do bispo.

Até um certo dia... Javert continua a perseguir Jean Valjean e julga tê-lo encontrado. O verdadeiro Jean Valjean luta com a sua consciência. Centenas de pessoas dependem agora dele. Mas poderá deixar um inocente pagar pelas suas culpas? M. Madeleine... Jean Valjean... 24 601...

Who Am I? A letra é desnecessária, está no vídeo. «My soul belongs to God, I know/I made that bargain long ago



Jean Valjean, julgo, é a maior personagem da literatura universal. A seguir vem Pierre Bezukhov, de Guerra e Paz (a personagem que, sendo já a minha favorita do livro, me fez apaixonar por Anthony Hopkins, tinha eu doze anos). Só depois vem o meu querido Afonso da Maia. Notem que estou a falar da grandiosidade de construção de uma personagem. Adoro-os a todos, mas as minhas personagens favoritas serão sempre Lizzie Bennet, de Jane Austen — a primeiríssima! —, seguidas pela Zé de Enid Blyton nos Cinco e, claro, pelo Guilherme (a saudade do Nuno a ferir outra vez).

Aqui, em Bring Him Home, quando resgata Marius pelos esgotos de Paris, depois de caída a barricada. Todo ele generosidade e abnegação. E aquela nota final a prolongar-se no infinito, a mostrar o extraordinário cantor que Colm Wilkinson é....



Jean Valjean é uma personagem universal e intemporal. Nele o bem e o mal lutam entre si, e o bem sai vencedor. Jean Valjean é um modelo: não é perfeito, mas tem, depois do encontro com o bispo, um ideal de perfeição. Ao qual tenta ser fiel. No momento da morte (muito lhe será perdoado, porque muito amou) suplica a Deus «forgive all my trespasses and take me to Your glory». Os fantasmas de Fantine e Éponine estendem-lhe as mãos, chamam-no, com aquelas maravilhosas palavras que foram bem a vida de Jean Valjean: «To love another person is to see the face of God


Jean Valjean morre em paz e rodeado de amor. É nesta fase do campeonato que os olhos inchados de tanto chorar já me dificultam a visão do palco, por melhores que sejam os lugares. Um gigantesco agradecimento ao Blanco, concierge do Westbury, onde tínhamos ficado, que nos proporcionou um Les Misérables absolutamente perfeito (house seats), o melhor de todos os que já vimos. E mesa no Nobu, coisa impossível à época. E lugares soberbos para An Ideal Husband, do meu amado Oscar Wilde... I Blanco.

O retrato abaixo é dessa noite memorável de Fevereiro de 1999. Eskisito, socorro! Isto está outra vez distorcido!


sexta-feira, 31 de outubro de 2008

I Les Misérables - III

Tinha devorado Os Miseráveis, de Victor Hugo, lá pelos meus treze ou catorze anos — os cinco volumes, sim. Apaixonei-me logo pela primeira personagem que nos é apresentada, o bispo, e a partir daí não consegui parar até chegar ao fim, coisa que levou menos de duas semanas. Viria, inevitavelmente, a reler tudo depois de ter conhecido a obra musical.

Quando o Vítor me ofereceu o disco, ainda na versão da Broadway (esta) fiquei muito tempo a olhar para a capa. Aquela imagem, que eu ainda não sabia ser da pequena Cosette, titilava memórias com mais de vinte anos. Eu conhecia aquela imagem! Fui direita à estante, peguei no primeiro volume, que reproduzia (como os restantes, aliás) as gravuras da edição original, de 1862. E encontrei a gravura de Émile Bayard que retratava Cosette quando ainda vivia com os tenebrosos Thénardier, antes de ser salva por Jean Valjean — a gravura que, cento e vinte e tal anos depois, viria a ficar célebre mundo fora como imagem do musical.

No musical é justamente nessa época de grande infelicidade que a pequena Cosette, enquanto varre e lava o chão da taberna, canta Castle on a Cloud. Podem ouvi-la no link, podem vê-la aqui, no já mítico concerto do 10.º aniversário:



Acabo de fazer uma descoberta sobre a qual as opiniões (como sobre o bardo Assurancetourix) podem dividir-se: para mim é dramática, para os leitores da Gota é provavelmente um alívio. Citando palavras do bispo, «see in this some higher plan», há uma coisa que eu quero pôr aqui no dia 3 de Novembro. Para tal, preciso de apresentar na véspera uma certa coisa dos Miseráveis. O que só me deixa livre o dia de amanhã. Adeus planos de vos apresentar coisas magníficas como a morte de Fantine, Red and Black ou Empty Chairs at Empty Tables. Ou o glorioso final. «Ora bolas! Com tantas coisas a cortar já não deve sobrar nada!», pensarão os meus amigos. Enganam-se, enganam-se! Falta Javert. E falta, claro está, Jean Valjean!

Não tinha pensado num possível plano B: pôr aqui tudo isso depois do dia 4 de Novembro. Começa a tentar-me, mesmo tendo alguns escrúpulos em ser injusta com outras grandiosas noites de Teatro que tive, cujo único azar é não estarem documentadas no Youtube.

Amanhã logo se vê. Esta noite ficam com a Cosette adulta e o jovem Marius, que acabam de se apaixonar, coisa que acontece no momento em que põem os olhos um no outro, na boa tradição da Ópera — aliás esta cena sempre me fez lembrar a do final do I acto da Bohème, entre Rodolfo e Mimì.

Cosette é Judy Kuhn, Marius é o espantoso Michael Ball, que criou o papel em Londres e na Broadway. Não posso deixar de mencionar os desgarradores àpartes de Éponine (Lea Salonga), de quem já falei, e que levou Marius ao encontro de Cosette. E que assiste às suas declarações de amor eterno. Every word that he says is a dagger in me... He was never mine to lose... These are words he'll never say... not to me...



domingo, 26 de outubro de 2008

I Les Misérables - II

Sempre que revemos Les Misérables tiramos um retrato, já se tornou uma tradição. Este, de 2002, é o meu preferido.

Como já disse, são três horas de choradeira quase ininterrupta. Ainda não decorreu meia hora e eu já estou a ficar sem lenços... Tirando os momentos em que aparecem os estalajadeiros, os Thénardier, pais de Éponine, que escravizam a pequena Cosette. Estes incríveis vilões resultam de uma grande comicidade e o momento em que surgem em cena faz-nos descomprimir, tamanho o drama em palco. Fantine, depois de se prostituir, de vender dentes e cabelo para assegurar o sustento da filha e fazer face às constantes exigências de dinheiro dos Thénardier, morre nos braços de Jean Valjean, que lhe promete que olhará por Cosette como se fosse sua filha.

É então que os Thénardier nos são apresentados. E a casa vem abaixo! De repente, é impossível não rir., e não rir muito Porque os actores são sempre fantásticos e porque a letra é absolutamente brilhante.

Ora vejam... Alun Armstrong, grande actor, é o odioso mas irresistivelmente cómico M. Thénardier (o papel foi criado por ele). Jenny Galloway é Mme. Thénardier. Um grande momento de Teatro!



quinta-feira, 23 de outubro de 2008

I Les Misérables - I

Chora-se muito nesta obra. Chora-se baba e ranho quatro quintos do tempo. Como me disse um americano um nadinha embaraçado há coisa de dez anos, provavelmente encorajado pelo facto de me ter apanhado em flagrante a enxugar uma torrente de lágrimas, no fim do primeiro acto, «é sempre a mesma coisa! Já é a quinta vez que vejo isto e não consigo parar de chorar!». Já me fartei para aqui de chorar, só de coligir material para este post, que é sobre... Éponine.

Éponine é filha dos estalajadeiros, os Thénardier (lá iremos). À esquerda têm Frances Ruffelle, a primeira Éponine em Londres e em Nova Iorque, a mesma que estão a ouvir, no disco de Londres. Cheguei dez anos atrasada, nunca a vi em palco. Conhecemos Éponine criança (no livro), com a idade da pequena Cosette, escravizada pelos seus abomináveis pais. No musical só conhecemos a Éponine jovem mulher, e é infinitamente comovedora.

Apaixonou-se por Marius, que nem se apercebe da sua existência. Éponine assiste à paixão fulminante de Marius por Cosette (que não reconhece, evidentemente, é a criança de dez anos que Jean Valjean, fiel à promessa feita a Fantine, livrou dos desprezíveis Thénardier, seus pais). E sofre. Éponine faz-se mensageira, até leva um recado de um Marius perdido de amores a Cosette. Mas sofre. É o que nos conta em On My Own.

ON MY OWN
«And now I'm all alone again

Nowhere to turn, no one to go to.
Without a home, without a friend
without a face to say hello to
But now the night is near
And I can make-believe he's here

Sometimes I walk alone at night
When everybody else is sleeping
I think of him and then I'm happy
With the company I'm keeping
The city goes to bed
And I can live inside my head

On my own
Pretending he's beside me
All alone
I walk with him 'til morning
Without him, I feel his arms around me
And when I lose my way, I close my eyes and he has found me

In the rain
The pavement shines like silver
All the lights are misty in the river
In the darkness, the trees are full of starlight
And all I see is him and me forever and forever

And I know it's only in my mind
That I'm talking to myself and not to him
And although I know that he is blind
Still I say there's a way for us

I love him
But every day I'm lonely
All my life I've only been pretending
Without me, his world will go on turning
The world is full of happiness that I have never known

I love him
I love him
I love him...
But only on my own... »

Julgo que menos de meia dúzia, entre as pessoas que me lêem, vão dar-se ao trabalho, ou ter a curiosidade de ver e ouvir o que aqui fica hoje, e que tão tremendamente me toca. Não tem grande importância, é como na parábola do Evangelho, talvez a que me é mais querida: «Saiu o semeador a semear...»

Linzi Hately, a primeira Éponine que conheci, ainda antes daquela mágica primeira noite em Londres. O meu amigo João N., ao saber que eu estava viciada na obra, ofereceu-me Les Misérables - Stage by Stage em VHS. Há muito que tenho também em DVD.



Lea Salonga, a mesmíssima que foi a primeira Miss Saigon, na mesma cena, naquela tal noite que me teria feito vender a alma ao Diabo, a noite do 10.º aniversário.



Pouco adiante, Éponine morre nas barricadas. A Little Fall of Rain (ruidosos soluços cá deste lado). Morre nos braços de Marius, o seu amor impossível. Se não verterem abundantes lágrimas com esta cena, com esta música, só há uma explicação possível: vocês, meus amigos, têm uma calota polar no lugar do coração.




quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Mágicas Noite de Teatro #2: Les Misérables

Les Misérables (Les Mis, assim lhe chamamos afectuosamente, nós os taradinhos), como tema para um post, anda na minha cabeça há mais de ano e meio. Acabo por desistir sempre, que a minha paixão por esta obra é imensa, e receio de não ser capaz de a transmitir como desejaria e, acima de tudo, como ela merece. Mas agora o post torna-se premente porque quero partilhar convosco uma coisa hilariante, e a data-limite está cada vez mais próxima, é já a 3 de Novembro...

A imagem à esquerda é do programa da primeira vez que vi Les Misérables em palco, no querido Palace Theatre de Londres. Uma noite inesquecível de um fim-de-semana que foi o presente (antecipado) do Vítor pelos meus 35 anos. Um dia talvez conte a história toda. De como, depois de uma sucessão incrível de azares, acabámos por ocupar duas gigantescas suites contíguas no famoso Claridge's. Mas o melhor da história talvez seja mesmo o argumento dos melões de Almeirim, com que confrontei o gerente e nos rendeu um pequeno-almoço de nababos. Adiante...

Depois dessa primeira noite (retrato à direita), ia o musical em quase dez anos de representações, houve outras, em Londres e também em Nova Iorque. Em Londres era sempre melhor (para restabelecer o equilíbrio, o Chicago de Nova Iorque é sempre melhor, se bem que, acreditem ou não, o melhor Chicago que vi foi... em Lisboa), agora já não há termo de comparação, já não há Les Misérables na Broadway.

Eu e o Vítor somos juntos, desde os catorze anos, aquilo que vocês já vão sabendo. Partilhamos tudo, partilhamos, mais do que quaisquer outras coisas, e porque são o melhor de nós mesmos, o riso e a música. Aos dezassete anos, sentados lado a lado, distraíamo-nos do tédio das aulas de Direito (aulas em que se fumava, pasmem!) a fazer listas. Listas das melhores músicas dos Beatles, das melhores músicas dos Simon & Garfunkel... Mas só a meio da casa dos trinta começámos a partilhar a Ópera (o meu contributo para o património comum) e os Musicais (o dele). E tudo começou com esta obra. Não vou contar aqui a história, é demasiado pessoal, demasiado íntima. A música com que o Vítor me apresentou Les Misérables vinha direitinha ao encontro de coisas que me doíam muito e, quando chegou ao fim, eu estava lavada em lágrimas. E pedi para ouvir outra vez. E mais outra... Nem sequer vou dizer qual é, talvez um dia um de vocês adivinhe.

No dia seguinte o Vítor ofereceu-me o disco (este, a versão da Broadway, que foi a que ouvimos nos tempos seguintes, têm à esquerda a capa do programa de Nova Iorque, guardo tudo religiosamente). Aquilo tornou-se para mim uma obsessão, não se ouvia outra coisa em minha casa. Peguei a obsessão ao namorado nessa época recente, a primeira vez que o vi chorar foi a ouvir a cena da morte de Fantine... Come to Me, a maravilhosa Patty Lupone, que vi há mês e meio numa outra mágica noite de Teatro, e Colm Wilkinson, o meu trovador irlandês, o primeiro e inesquecível Jean Valjean... O passo seguinte era ver Les Misérables ao vivo, coisa que aconteceu dois meses depois.

No teatro, ao intervalo, o Vítor ofereceu-me o disco original, o de Londres, o melhor (a orquestra nem se compara),o que oiço sempre. Os cantores principais são os mesmos, dois anos mais tarde, em 1987, Les Misérables estreava na Broadway: Colm Wilkinson, Patty Lupone, Philip Quast, Frances Ruffelle, etc.

O post vai longo e a hora adiantada. Amanhã continuo, que muito há ainda a dizer. Deixo-vos com Do You Hear the People Sing?, que está longe (muito longe) de ser a minha música preferida. Acontece apenas que é uma das mais imediatas e empolgantes, talvez a que mais imediatamente se nos instala no ouvido como uma mania. As palavras fabulosas de Herbert Kretzmer, o senhor das letras inglesas de Charles Aznavour. E há outra razão: o vídeo, este vídeo do concerto de celebração do 10.º aniversário. Les Misérables tinha corrido mundo, já havia incontáveis produções. Nessa noite (que Deus me perdoe, mas também teria vendido a alma ao Diabo para ter lá estado), DEZASSETE Jean Valjeans de dezassete produções diferentes da obra cantam esta música, cada um na língua da respectiva produção. O primeiro é Colm Wilkinson, o criador do papel em Londres e na Broadway, e que nessa noite tinha voltado a cantá-lo. O segundo é Phil Cavill... que foi o meu primeiro Jean Valjean em palco, naquele dia 6 de Agosto de 1995.

Preparem-se para um momento mágico.