quarta-feira, 19 de março de 2014

Down the memory lane


Algures pelo princípio de 1997, o Rui emprestou-me uma cassete de vídeo com as gravações de dois programas de televisão em que tinha participado como convidado, e que eu não tinha podido ver. O tempo passou, nunca mais me lembrei de lhe devolver a cassete, ele nunca mais se lembrou de ma pedir. Passou mais tempo ainda, o VHS acabou, chegou o DVD, e a cassete continuava a morar na minha estante. E depois, quatro dias a seguir ao 11 de Setembro, o Rui morreu. Foi a enterrar no dia dos 15 anos da Marta, a filha mais nova, que eu quase vi nascer (estava no corredor, à porta da sala de partos), e que nunca mais poderá dissociar o dia dos seus anos dessa tragédia que tão cedo se abateu sobre ela.

Nos anos seguintes, o meu desconforto sempre que dava com os olhos na cassete ainda na estante foi aumentando mais e mais. Aquilo tinha de ser preservado, para começar; e, principalmente, aquilo não devia estar comigo, devia estar com a família. Um belo dia, decidi pedir ajuda ao meu querido amigo Zé Luís, que me fez a conversão de VHS para DVD, e depois esperei duas ou três semanas, o tempo de fazer chegar o inesperado presente às mãos da Marta no dia dos seus 20 anos.

Como também os DVD se estragam, resolvi acautelar ainda mais os dois segmentos filmados, e é com a autorização e aprovação entusiásticas da Marta que aqui ponho agora um deles. Confesso que deu algum trabalho, nunca tinha extraído ficheiros de um DVD, tive de pesquisar e encontrar (depois de várias tentativas mal sucedidas) os melhores programas para o fazer. Mas acredito firmemente na validade da máxima «se sabes ler, sabes fazer».

Em Janeiro de 1997, no programa da RTP1 Canal Aberto, apresentado por Manuela Sousa Rama, o Rui explicava em linguagem simples e acessível o que era essa coisa nova que andava em todas as bocas mas que muita gente desconhecia o que fosse, como funcionava e para que servia: a Internet.

Fico feliz por poder oferecer hoje à Marta, quase oito anos depois, esta extensão do presente de 2006. Porque hoje é Dia do Pai, e ela tem todas as razões e mais algumas para se orgulhar do pai que Deus lhe deu. 

Recomendo a todos que vejam o vídeo abaixo, porque vão sorrir ao lembrar como as coisas eram nessa altura. E, em simultâneo, vão conhecer um pouco o Rui como eu o conheci, grande comunicador (mal se dá pela presença do outro convidado, professor universitário e especialista em informática), parece que estamos na sua sala com um café em frente. E reparem como o Rui é lúcido e sensato nas coisas que diz sobre o mau uso da Internet, por exemplo, e nas suas mil utilizações diversas e possíveis. Todas essas coisas que para nós são hoje evidentes não o eram nada naquela época, ele é que era um pioneiro.

Vejam, porque vão gostar de lembrar como foi o princípio. Sorriam dos preços, sorriam da primeira informação sobre a Internet: é preciso ter um telefone. E continuem a ver. Aposto que já não se lembravam daquele barulho horrível quando acedíamos à rede.





8 comentários:

  1. Isto é uma pérola, Teresa. Obrigado.
    Estou divertidíssimo a recordar como era isto da internet no tempo dos nossos avós. Ah não era?

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    1. Fascinante, não é?
      E os preços? Aos valores daquela época, pagaríamos hoje mais de 500 euros por mês só para estarmos ligados.
      Pensa que isto foi há 17 anos, bem antes de haver Google (os motores de busca eram Alta Vista, Yahoo e outros assim) ou uma Amazon. Acho especialmente interessante (e histórico) o passeio do Rui pelos mais procurados pelo FBI, Bin Laden ainda não está lá, só entraria para a lista em 1998.
      Lembro-me de ter visto Hannibal no ano em que saiu, 1999, e temos um vislumbre pela página em que ele aparece, nem dei por nada. Só já em 2003 ou 2004, quando revi o filme, reparei nesse pormenor, e tive calafrios.

      E o fax? O Rui refere-o quando se fala na ocupação da linha telefónica. Quando foi a última vez que enviaste um fax? Lembras-te? Eu não devo enviar nenhum há uns bons dez anos.

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    2. P.S. O Rui era realmente um visionário que tirava o melhor partido de tudo, sempre na linha da frente a descobrir coisas.
      Repara no que ele começa a dizer aos 42:09 sobre utilizações indevidas. «Estamos a falar do mundo inteiro, do planeta inteiro, com toda as vantagens e inconvenientes que tem a rua. Na rua também encontramos pessoas civilizadas, pouco civilizadas, bandidos, assaltantes, pistoleiros, gente séria, santos...»
      Esta observação tão espontânea até à blogosfera se aplica extraordinariamente bem, se pensares nisso.

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    3. Exactamente.
      E é engraçado vê-lo tão fascinado a explicar como funcionava aquele admirável mundo novo.

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  2. «Quem não admirará os progressos deste século?», já dizia Eça em A Cidade e as Serras. Só que era sobre o séc. XIX. :)

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  3. Obrigada Teresa! É difícil arranjar mais palavras para explicar o meu sentimento em relação a este tema. Este é o melhor presente que eu poderia ter recebido - é a forma possível de imortalizar um momento (engraçado) ao qual eu e os meus filhos poderemos ter acesso sempre que as saudades apertarem e nós quisermos visitar o Avô Rui.
    Não há palavras! Obrigada, do fundo do coração <3

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    1. Os agradecimentos são desnecessários, Marta, o seu pai e eu éramos grandes amigos.
      Os ficheiros com os filmes estão a ser-lhe enviados neste momento, porque também o YouTube pode acabar, não é?
      Grande beijinho.

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    2. E o ficheiro em que o pai toca piano lá em casa já está aqui:
      https://www.youtube.com/watch?v=-ruxtWGqWsM

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