segunda-feira, 9 de maio de 2011

No bar da Católica

Esta história, ontem prometida, passou-se há muito, muito tempo, no tempo em que os animais falavam. Admito que os animais falantes até já pudessem estar em vias de extinção, mas ainda tínhamos o Camané. O Camané, justiça lhe seja feita, era muito prestável e era muito simpático, qualidades que nos fariam mais condescendentes com ele se não fosse passarmos a vida a esbarrar na sua profunda estupidez. Céus, como era estúpido! Digno de subir ao podium da estupidez suprema e ombrear com as personagens mais estúpidas de sempre da banda desenhada: Ran Tan Plan, Averell Dalton e Salamix (de Astérix na Córsega).

Por outro lado, éramos muito discretos e tínhamos muito tacto: o Camané, que devia ser pouco mais velho do que nós, era filho da D. Iolanda, também empregada do bar, uma jóia de senhora, de quem todos gostávamos muito. Ela e a D. Lurdinhas eram as nossas empregadas favoritas. Ainda lembro com carinho que me adoravam, e que vinham sempre avisar-me quando tiravam os queques do forno. Os queques da Católica eram lendários, e lá ia eu enfiar-me na cozinha e deliciar-me com as raspas de massa que ficavam no tabuleiro.

Num belo dia, a meio da manhã, eu e o Vítor chegámo-nos ao balcão. O Camané, acorreu, solícito. Eu pedi um café e provavelmente um queque (dois ou três por manhã, e não engordava, feliz idade!). O Vítor pediu também café e começou a passear os olhos pelos bolos em exposição. Nenhum lhe apetecia, mas apetecia-lhe qualquer coisa, só não sabia o quê. Os olhos desviaram-se para as prateleiras por trás do Camané, passearam indolentemente... e pararam numa expositor de chocolates da Regina, essa venerável instituição nacional. Voilà! Era mesmo aquilo que lhe apetecia! 

- Já sei. É um Coma Com Pão, se faz favor!

O Camané era sempre muito cerimonioso connosco, os futuros doutores. Virou-se, tirou um chocolate, tendo o cuidado de o pôr num pires antes de o apresentar ao balcão. E acrescentou, solícito:

- Deseja carcaça?

O Vítor ficou desconcertado.

- Como?

Eu percebi logo, e explodi numa gargalhada monstuosa.

- Deseja carcaça? - repetiu o Camané, muito sério.

De repente a pergunta atingiu o Vítor em cheio em todo o seu absurdo, fez-se luz. E era ver-nos aos dois a rir histericamente, agarrados um ao outro, sem conseguir parar. A imagem nas nossas cabeças era irresistivelmente cómica.




Agradecimento à T, do Dias Que Voam, que me forneceu a imagem de um antigo anúncio do chocolate. Não era este que eu lembrava, mas cumpre muito bem.

8 comentários:

  1. Ó Teresa... Desculpe lá, mas agora fiquei intrigada. Então se o chocolate não era para comer no pão porque é que tinha esse nome? Depois investiguei e encontrei isto: http://www.ionline.pt/conteudo/121348-coma-com-pao-o-regresso-um-classico

    De certeza que este chocolate não se comia mesmo com pão (fala alguém nascido em 89, e que está a ouvir falar do chocolate pela primeira vez)?

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  2. Querida Secretária,
    O chocolate era óptimo, chocolate de leite normalíssimo. Mas nunca conheci ninguém a quem pudesse ter passado pela cabeça experimentá-lo género sanduiche.

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  3. Se tiver tempo, leia a crónica. Pelos vistos este jornalista do I fazia-o. E realmente a embalagem mostra-nos uma menina de carcaça na mão... Se calhar o Camané desta vez nem estava a ser assim tão estúpido...

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  4. Ora bolas, tanta vez que já comi chocolate assim (Derreti no microondas, primeiro.)!

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  5. Num colégio de férias onde estive quando tinha 10, 11 anos, os lanches incluíam pedaços de tablette de chocolate e pão seco.
    Eu não estava habituada e não me habituei, mas o resto da miudagem parecia achar normal.

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  6. Eu e o meu irmão comemos o Coma com pão num pão :3
    E toda a gente na minha família (pai, tios, avós) sempre assim o fez também. E é uma delícia, as texturas e o sabor vão que é uma maravilha.
    Sempre pensei que se chamasse Coma com Pão para ser comido com pão :)

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  7. Pois eu, no tempo em que os animais falavam (e a raça ainda não está extinta, conheço alguns, actualmente, que continuam a fazê-lo), comia o comacompão... no pão!! Imagino as gargalhadas histéricas que dariam, se me vissem, naquela altura.
    enxofre

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  8. Os queques na Católica eram os melhores que já comi. Marchavam aos 2 de cada vez. Se fizesse isso agora teria de ir correr alguns 50 kms.. :-)

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