domingo, 26 de abril de 2009

I ♥ Bea Arthur


Nossa (minha e do Vítor) menina Bea Arthur partiu ontem, com 86 anos.

Adorávamo-la! A voz rouca, da qual ela própria fazia uma troça impiedosa, a altura portentosa (idem) que a fazia usar sempre sapatos rasos, timing perfeito como comediante.


The Golden Girls é e será sempre para nós dois (e para mais alguns milhões de pessoas) uma série de culto. Lembram-se da abertura?


E há Maude, também — tenho de comprar urgentemente as temporadas disponíveis. A série surgiu da sua personagem recorrente como prima de Edith (a maravilhosa Jean Stapleton) noutra série de referência obrigatória, All In The Family. É tocante ver que já a homenagearam. Vale a pena ver, garanto — até porque o genro de Archie Bunker é um senhor chamado Rob Reiner, que viria a realizar filmes brilhantes como When Harry Met Sally ou Misery, para nomear apenas dois.


Como o Vítor me escrevia esta madrugada... «Resta-me a consolação de nos ter levado a vê-la LIVE. Temos noção de que 99,9999999999999% das pessoas deste planeta não o fizeram, não é?»

Pois é, meus amigos. Nós vimos a grande, a incomparável, a única Bea Arthur ao vivo. E não foi em Nova Iorque, não.

A história já é lendária entre nós dois. Em Outubro de 2001 fomos juntos a Nova Iorque, famílias descabeladas a proclamarem que éramos doidos, só tinha passado um mês desde a tragédia e estávamos já no terror que se seguiu, o antraz. O que as famílias não percebiam era que já tínhamos coisa de doze ou treze peças de teatro pagas havia muitos meses, e bem caras tinham sido. Agradeço a Deus sermos quem somos e como somos, que nunca esqueceremos aquela viagem. Nova Iorque refazia-se aos poucos do golpe tremendo, as pessoas eram inesperadamente gentis e havia uma vaga generalizada de patriotismo. Era comum cruzarmo-nos nas ruas com um executivo com um fato que a olho nu se via ser Armani, quando não Saville Row, sapatos John Lobb... e na lapela um crachat a dizer coisas como «United We Stand» ou «Proud to be an American.» Também apanhei o reverso da medalha, um motorista de táxi, na penúltima noite, em que faltei indecentemente ao encontro com o Zé Luís, que na altura estava a estudar na Parson's School: estava tão exausta que o Vítor foi sozinho, eu só queria chegar ao meu quarto e deitar-me. Apanhei com um tarado islâmico a dizer que o 11 de Setembro tinha sido uma conspiração dos Judeus. Não refutei, que tenho amor à pele, mas nem imaginam o alívio que foi chegar ao hotel! Para marcar o meu desagrado, não dei gorjeta, toma!

Ora na nossa penúltima noite de quase duas semanas em Nova Iorque (12 dias), fomos ver Cabaret, do qual já falei. A seguir fomos jantar ao fabuloso Balthazar e perdemo-nos numa orgia de ostras. Em Portugal, em França, em Inglaterra a gente pede ostras... e vêm ostras. Nos Estados Unidos é mais complicado, tamanha a variedade — é só olharem para o mapa e verem o gigantismo daquelas duas costas, Leste e Oeste. Como saber quais eram as melhores? As do Maine? As da Carolina do Norte? As já não sei das quantas? Entregámo-nos nas mãos do criado, que começou por nos trazer uma selecção em pares das seis melhores qualidades, na sua opinião. Aprovámos todas, seleccionámos aquelas de que gostámos mais. Estávamos extravagantes, o jantar correu regado a Veuve Clicquot. Debatíamos até à exaustão a extraordinária produção de Cabaret que tínhamos visto, cada um de nós a lembrar momentos especiais.

O dia seguinte seria o último em Nova Iorque. Digo já que o Vítor é o meu companheiro de viagem ideal. Não vou para Nova Iorque, para Londres, Paris ou seja qual for a cidade para fazer compras. Principalmente nos tempos que correm, em que as coisas que mais me interessam (livros, discos e filmes) são de alcance fácil através da Internet. Ele é igual. Só que eu sou mulher.

A páginas tantas, no jantar no Balthazar, fiz uma advertência: no dia seguinte, ele que tivesse paciência, teríamos de perder algum tempo em compras, eu tinha de trazer presentes para a minha Mãe, para a minha irmã, para as minhas sobrinhas, para o namorado.

Foi então que o Vítor fez saltar o coelho da cartola. Tinha uma grande surpresa, aquela era mesmo a nossa última noite em Nova Iorque. Na manhã seguinte teríamos de sair bem cedo do hotel, rumo à Florida, para ver... nossa menina Bea Arthur, que actuava em Tampa!

Ri como uma doida, choraminguei um bocadinho, porque a adorava e fiquei comovida. Mais uma garrafa, o restaurante já quase vazio e o empregado, que tinha engraçado comigo, a deixar-me fumar, lembras-te?

Na manhã seguinte lá fomos. Tivemos uma pega parva (nunca disse que éramos perfeitos, e costumamos ter uma por viagem) que nos impediu de viver a dois aquele inesquecível levantar de La Guardia e sobrevoar Manhattan.

Vou poupar-te, Vítor, piadas ao depósito de gasolina do carro alugado (mas lembro-me, lol!)

Nossa menina Bea Arthur actuava nessa noite de Outubro, véspera de Halloween, no Tampa Bay Performing Arts Center. E nós lá estávamos. For once in a lifetime... deixa-me levar a minha avante: devíamos ter ido aos bastidores. Acredito que ela gostaria de saber que havia dois portugueses com a paixão do Teatro que tinham ido ali de propósito para a ver! Lembra-te do meu encontro com Dame Vanessa Redgrave...

Bea Arthur foi espantosa nessa noite. Até estava com um pé engessado, mas a gente do Teatro é estóica. Rimos como doidos. A seguir (alinhamento de planetas) embarcámos numa experiência bizarra, o Guavaween. Uma espécie de carnaval que antecede o Halloween em Tampa. Tivemos um dos jantares mais memoráveis da nossa vida. Íamos com restaurante marcado (sempre o Zagat!), o concierge sorriu e disse que já havia um japonês melhor, novo, o Samurai Blue. Confiámos... e correu bem. O sushi-san acabou por vir à nossa mesa agradecer os elogios (ainda tenho a ementa), a verdade era que comemos melhor do que tínhamos comido no Nobu de Nova Iorque, e por um quarto do preço.

Tenho imagens dessa noite, de frio inexplicável para a Florida. Eu de casaco de cabedal e cachecol de caxemira, de escocês encarnado. Adorava aquele cachecol, perdi-o nessa noite. No último retrato, quando estou a gritar «VIVA O BENFICA!», ainda tenho o cachecol. Depois perdi-lhe o rasto. Só tu para assinalares que uma portuguesa singular, em Tampa, Florida, foi ver Bea Arthur actuar e gritou vivas ao Benfica!

Ela vai ficar sempre connosco, não vai? Nossa menina Bea.... (e agora estou a chorar, gostava tanto dela!) is no more.

Banda sonora, ouvida nessa noite mágica: Bea Arthur - The Nun's Story

3 comentários:

  1. Provavelmente, as minhas duas séries preferidas de todos os tempos :)

    Fantástica, ela.

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  2. Ela era FABULOSA.
    Minha menina Bea...
    Nem sei dizer-te o que esta partida me doeu. A próxima, sinto, vai ser Elaine Stricht...

    Não sou boa a dizer adeus às pessoas de quem gosto. Sofro demasiado.

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  3. Bolas, agora fiquei chocada.
    Não fazia ideia...
    Não me sai nada de jeito, tenho de absorver.
    :(

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