sábado, 9 de junho de 2012

Crisis? What Crisis?

Ando muito seriamente a tentar deixar de fumar, se bem que quase toda a gente me diga que este momento é provavelmente o menos adequado de todos, como se eu não tivesse já suficientes batalhas pela frente. Mas tenho as minhas razões, e são poderosas.

Ora ontem ia a caminho do IPO para fazer mais um exame e ia enervadíssima. Tudo em mim pedia um cigarro, a coisa estava a tornar-se uma obsessão. E acabei por fazer uma coisa que muito poucas vezes fiz na minha vida, e que detesto que me façam (até porque sou incapaz de recusar, o que já resultou, por exemplo, em dar cinco cigarros no percurso entre o Rossio e o Terreiro do Paço): pedir um cigarro a um estranho.

Cruzei-me com um senhor de bom ar, dos seus 60 anos, que ia a fumar. Morta de vergonha, a enrolar as palavras, murmurei qualquer coisa como «Desculpe, será que pode dar-me um cigarro?»

O senhor estendeu-me prontamente o maço, esperou que eu tirasse o cigarro para mo acender, olhou-me de alto a baixo e comentou:

— Isto está mesmo mal, hem?

Encavacada, com vontade de que o chão me engolisse, acenei que sim. «É. Estou desempregada.»

—  Calculei. Com uma Louis Vuitton que se vê bem que não é de Carcavelos... Olhe, eu há quatro anos andava de BMW, agora guio um chaço de 400 euros.

Podia ter acrescentado «E eu tenho cancro. Ganho eu!», mas abstive-me. Apertámos cordialmente as mãos e desejámo-nos um bom resto de dia e melhor sorte.

E os reembolsos do IRS? Nos anos anteriores foram sempre 20 dias certimhos, religiosamente contados, o tempo entre a entrega da declaração e a entrada do dinheiro na minha conta, e o mesmo aconteceu com toda a gente que conheço. Este ano é uma anedota. O Abel fez a declaração no dia 2 de Maio e continua à espera. Eu entreguei a 19, deveria ter recebido ontem. Está bem, abelha! Ontem, a única coisa que fizeram (porque passo a vida a espreitar o portal das finanças) foi passar a minha situação de "certa" a "direito a reembolso" — e com data de 3 de Junho, para dar melhor aspecto. Vai esperando, Abel. Vai esperando, Maria Teresa.

E sabiam que os doentes oncológicos no desemprego, no anterior governo, recebiam uma comparticipação (ou a totalidade, não tenho a certeza) para os transportes? Agora já não. E sabiam que para poder ter isenção de pagamento de taxa moderadora nos hospitais por incapacidade é preciso ir a uma junta médica? Até aqui nada de anormal, acho mais do que justo. O que já acho bizarro, para não dizer pior, é que para tal se tenha de pagar 50 euros.

Bem sabem que nunca aqui fiz comentários à situação política, com a única excepção do acordo ortográfico. Mas agora apetece-me mesmo pôr a boca no trombone. Muito podia eu contar!

Banda Sonora: Supertramp - Two of Us (do álbum Crisis? What Crisis?)

13 comentários:

  1. Não fazia ideia que também estás desempregada, Teresa.

    Enfim, este governo, não quero saber de cores, sempre tive as minhas definidas mas nem é a questão da cor. É a destruição gratuita e sem resultados positivos de tanta coisa que se alcançou. Custa-me assistir e custa-me ainda mais perceber que não há luz ao fundo do túnel, se isto perdurar por mais anos. Que tenho 33 anos, estou mal e só vai piorar. Não me venham dizer para ter iniciativa, criatividade, seja lá o que for. Tudo isso já tive, demasiada. Num país, com dirigentes que não merecem. Nem sei se o povo merece. Tanto esforço em vão.

    A saúde? O que será da saúde, das pessoas, com as alterações que se avizinham? Acreditam mesmo que os seguros as vão proteger? Os seguros foram criados para ganhar dinheiro. A ingenuidade tem limites.

    Ninguém abre a pestana? Já tenho inveja dos gregos, dos Irlandeses. Ninguém se mexe. Lá está, sou sempre a "reaccionária".

    Enfim, adiante, fora as políticas, fora a situação financeira que nos deita muito abaixo, há coisas muito mais importantes. Família, amigos, saúde. Protejamos esses. Valorizemos esses.

    Um grande beijinho. Sei que vais dar a volta por cima, só sei isso.

    Desculpa o desabafo mas hoje em dia nem se pode dizer nada contra estes canalhas que toda a gente se melindra, por isso sabe bem poder abrir a boca junto de quem nos compreende. Os salvadores, pois. País à venda ao desbarato.

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  2. Pois é, agora as juntas médicas pagam-se. A minha mãe ainda teve direito a fazer sem pagar mas estou a ver que para renovar a incapacidade irá ter que pagar também. Foi numa altura em que aumentaram as vacinas de uma maneira louca e as juntas médicas que eram gratuitas passaram para essa estupidez. Ora, uma pessoa pede o procedimento para ser isento e para ser isento tem que desembolsar esse dinheiro! É bonito!

    Quando a minha mãe adoeceu andei a pesquisar todos os benefícios que ela teria. É uma revolta grande termos que o fazer, por ser sinal de doença. Mas já que quando nos prejudicam não olham para trás, por que razão não havemos de procurar aquilo que nos é de direito.

    Eu não sei o que agora está em vigor mas, por exemplo, um doente oncológico também ficava isento do Imposto único de circulação. Tem a isenção de taxas moderadoras e tem também benefícios fiscais a nível do IRS.

    E falando de IRS, eu também meti o dos meus pais dia 5 de maio e nada. Ainda atrasou o processo porque foram chamados a apresentar os recibos do salário porque a entidade patronal do meu pai nem se deu ao trabalho de enviar os ficheiros com os descontos dos trabalhadores. É uma treta.

    Um beijinho cheio de força

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  3. Yes, you can...muito, muito sinceramente! All the best!

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  4. ainda por cima desempregada?! bolas, Teresa... desejo-lhe toda a sorte do mundo!

    qt ao resto do seu post... o povinho não os pôs lá?... e a agenda liberal do passos coelho não foi por este anunciada aos 4 ventos durante a campanha eleitoral? então, queixam-se do quê? não é qualquer surpresa, infelizmente...

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  5. Estou francamente escandalizada. Não fazia ideia dessa situação, achava que as isenções dependiam dos rendimentos, que é algo fácil de demonstrar. Desde que este governo foi eleito já o repeti umas cem vezes, mas digo mais uma: não é para isto que pago impostos. Não é. Vão matar o SNS, e qualquer rede de apoio a quem precisa.
    Força, muita força e paciência.

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  6. Um beijinho Teresa. Every little thing is gonna be alright...

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  7. Teresa, toda a força do mundo. E isso que conta é verdadeiramente chocante.

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  8. Alexandra, como pode dizer que até parece que não se pode dizer nada?? pode dizer sempre tudo! aliás, estes das agendas liberais também contam com isso: que as pessoas tenham medo de falar, de dizer o que está mal, de parecerem ignorantes sobre as medidas económicas de que eles se dizem tão especialistas...bah, vão para o c*r*lho, perdoe-me a gota de ran tan plan.
    E reaccionária não é quem diz o que pensa e critica o governo...aliás o dicionário até diz que um dos significados é 'oposto à liberdade'.
    Gota de Ran Tan Plan: ler o que escreveu aqui dá-me volta ao estômago. Pensamos que este governo é capaz de tudo, mas estas histórias contadas na primeira pessoa, de facto impressionam. Já não é a primeira vez que digo isto: de bom grado viveria num país em que metade dos meus rendimentos fossem para impostos, para saúde, educação, etc, tudo o que está escrito na Constituição como sendo um Direito Fundamental. Aliás, lá também está escrito que é dever do Estado garantir e promover os Direitos Fundamentais...

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  9. O Estado não tem dinheiro para pagar os reembolsos. E como tal está a adiar os pagamentos. É a triste situação a que chegámos.
    Fico verdadeiramente escandalizada quando se tem de pagar para ir a uma Junta Médica, provar um grau de deficiência, mas não se paga taxa moderadora para fazer um aborto. As prioridades continuam muito mal definidas.
    Um grande beijinho e muita força.

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  10. Olá Teresa,

    Sabe que a sigo há já...uns 4 anos? Mais?
    Lamento imenso essa situação de desemprego e se puder ajudar em alguma coisa, disponha.
    Quanto ao IPO...não sei o que dizer, apenas que desejo as melhoras, espírito aberto e boa disposição.
    Ah! E deixe de fumar sff!
    Um abraço

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  11. Desempregada que estou há 1 ano e meio, não pago nem recebo IRS - nem declarei.
    Mas há quem esteja muito pior e não é com regozijo que o digo.
    Do fundo do coração,Teresa, desejo que mantenha a força e a fé na sua cura, que o resto se há-de compor.
    Abraço amigo.

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  12. Teresa

    Já sabia dessa noticia, mas para eles
    é tudo à grande, não lhes falta nada!
    ~Sou como a primeira comentadora, falo e barafusto.
    Força, Teresa.

    Bjocas
    Karocha

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  13. Teresa, lamento que tenha mais essa adversidade para lidar, a qual eu também desconhecia. Todas estas situações são inadmissíveis. Os pacientes passaram primeiro a utentes e agora a clientes: tudo é pago. É a destruição do SNS.
    Eu estou a sentir e de que maneira os efeitos desta crise. Tenho salários em atraso desde Fevereiro e a empresa aguarda a declaração de insolvência há quase um mês, dando origem a que nós, trabalhadores, façamos piquetes para evitar a saida do pouco material que ainda existe, porque enquanto a insolvância não for decretada não está a salvo dos credores e de penhoras. Não me sabem dizer quando é que vou começar a receber o subsídio de desemprego e para ajudar à festa o meu IRS ainda não foi pago porque a entidade patronal do meu marido se enganou a preencher a declaração. Estou a delapidar as minhas economias para fazer face às despesas imediatas e temo pelo futuro que vou conseguir dar ao meu filho. Este pais não é para velhos, nem para novos, nem para quem quer trabalhar por um futuro melhor, muito menos para doentes. Não sei onde vamos parar. Gostava de ter confiança no futuro e calar as vozes negativas, inverter este estigma do fado lusitano, mas dou por mim a pensar do que será desta geração. E sobretudo do que será de nós.
    Teresa, desculpe o testamento. Um grande abraço.

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