terça-feira, 22 de maio de 2012

The Big C

É uma lotaria. E eu, que sempre fui uma rapariga cheia de sorte, fui contemplada. O tipo escolheu-me.

Sim, sim, é isso. Estou com um filho da puta de um cancro. Bem sabem que odeio palavrões, mas não há mesmo nomes amenos para dar ao bicho. E não há dúvida que um palavrão bem puxado, se não resolve nada, às vezes sempre alivia um bocadinho.

Hesitei muito antes de contar isto, já que sempre tentei controlar bastante o grau de exposição das coisas que aqui escrevo. Mas mensagens diversas e enternecedoramente carinhosas que tenho recebido, algumas de pessoas que me lêem há anos sem que eu desconfiasse, por não deixarem comentários, mensagens a indagar as razões pelas quais nada escrevo aqui há tanto tempo, fizeram-me reconsiderar.

De resto, devo dizer que este hiato pouco habitual no blogue, mesmo estando eu longe de ser daquelas pessoas que acham que têm de publicar todos os dias, nada tem que ver com este bicho que só agora me foi confirmado. Problemas muitos, problemas sérios, têm-me impedido ou tirado a vontade de publicar, é tão simples como isso.

O blogue continua na linha de sempre, quando, como e se eu puder, não vai haver aqui registos de coisas que toda a gente já sabe como são, infelizmente. No dia em que o comecei, há quase seis anos, tentei definir no cabeçalho aquilo que pretendia fazer dele; nunca alterei o que então escrevi, e julgo que consegui ser consistentemente fiel a essas linhas-mestras: «Um sítio para partilhar histórias antigas e recentes. Música e livros. Filmes. E a rir, se possível.»

Por isso, meus queridos amigos, isto não vai passar a ser um diário de quimioterapias (lá se me vai o meu rico cabelo, a melhor coisa que tenho, digam lá que não sou uma sortuda?), mal-estares, desânimos e todos os medos que me assaltam. Porque eu estou transida de medo, vamos lá chamar os bois pelos nomes. Sei o que me espera e como é duro, sei também que daqui nem toda a gente sai viva. E a verdade é que não me apetece nada morrer com os 52 anos que faço em Agosto, com tanta música nova ainda por ouvir e tanta que é de sempre e à qual volto sempre como a um colo maternal, com tanto livro para ler, com tanto livro tão amado para reler, com tantas viagens por fazer (o verso lindo de Moon River que há anos me obceca: «there's such a lot of world to see!»), tantos sítios por descobrir, tantos sítios aos quais o coração só me pede que volte.

A Gota de Ran Tan Plan continua. Como eu. O resto logo se vê.