Das coisas que me faltam
Reconheço humilhada que não tenho uma sensibilidade por aí além para a pintura. A falha é minha, disso tenho a certeza. Nunca um quadro conseguirá pôr-me em lágrimas com a mesma facilidade espontânea de uma música, de uma página de um livro, de um poema, de uma dança, de uma cena de um filme, de um grande momento de teatro.
É certo que há obras que me põem a sonhar. Espraiam-se ao longo de mais de 500 anos, os nomes vão de Giotto, Botticelli e Leonardo (e a minha famosa frase, «tenho para mim que a humanidade só conheceu dois génios absolutos, Leonardo e Mozart», continua hoje a fazer rir o Vítor como fazia há vinte anos), a Dalí e Magritte, passando por Vermeer, Rembrandt, Turner, Greco, Monet, Renoir e Van Gogh.
Lembro-me de, no Prado, ficar mais de meia hora sentada no chão a pasmar para Os Fuzilamentos da Moncloa, de Goya, lembro-me de não conseguir arredar pé do espantoso retrato de Maria Tudor por Antonio Moro (ou Anthonis Mor). Mas a minha relação com a pintura não é das mais fecundas, falta-me sensibilidade. Já o meu amigo A., em deambulações pelos antiquários do Quais Voltaire, me dizia «tu não percebes nada de pintura!»
Ainda assim, eu, que não seria capaz de desenhar um balde de plástico, maravilho-me com o talento alheio. E é o caso da minha amiga Pituxa. Não me perguntem porquê, não saberia explicar. O que sei é que gosto mesmo muito de tudo o que ela pinta, atinge-me uma qualquer corda sensível. A Pituxa tem agora boa parte da obra visível na Internet, é só ir aqui.
Em Novembro passado estive na inauguração da exposição colectiva em que ela tinha muitos quadros. Foi um triunfo, mais de metade foi vendida nesse mesmo dia. Eu e a Madalena, radiantes com o sucesso da nossa amiga, vagueávamos pelas salas, flûte de champagne na mão. E continuamos à espera do resto das fotografias, ouvisteS, Pituxa?
(e aposto que não conheces estes, Pituxa! 1972, de um disco chamado Englishe Musicke)
Teresa, também não me emociono tão facilmente por uma pintura como por uma passagem de um livro, uma fotografia ou um música; mas adoro museus, apreciar as obras primas que por lá moram, demorar-me nalgumas delas, com os meus olhos de mera apreciadora e zero de 'conhecedora'.
ResponderEliminarAcho que a pintura é uma das formas mais interessantes de conhecer a história de um país (bem como a História Universal)... No caso português, Paula Rego, por exemplo, revela muito do país em determinadas épocas através das suas obras.
Dulce, também não me passa pela cabeça conhcer uma cidade sem lhe visitar os museus. E garanto-lhe que não é para cumprir tarefa. Vejo com olhos de ver, mesmo que a pintura não tenha o condão de me emocionar como outras artes.
ResponderEliminarE ainda me apetece dar estalos a mim mesma por ter trocado, na minha última ida a NY, uma exposição temporária de Dalí no Moma pela Frick Collection (onde está aquele soberbo S. Francisco de Assis no Deserto). Não havendo tempo para as duas coisas, optou-se pela temporária, que se revelou medíocre.
Já Paula Rego... gosto muito, na generalidade. Acontece que no trabalho tenho a poucos metros de mim um quadro dela que me revolve as entranhas. Aquilo é medonho. Um cão explicitamente em cio. Mais uma vez, o defeito deve estar em mim, aquilo deve ter uma mensagem, eu é que não sei lê-la.
Uma das lacunas que sinto na minha formação é a educação para a Arte (todas as artes!). E percebo pelas suas palavras, que não sou a única a queixar-me... Não nos deram a chave e sozinhos temos dificuldade em entrar em certos mundos altamente simbólicos... Acho que Paula Rego conseguiu o que pretendia: incomoda, não nos deixa indiferentes... Não me imagino a ser obrigada a olhar para a mesma obra dela, todos os dias, no meu local de trabalho. Estou aqui a pensar que o mesmo se passa com a música. Não oiço um requiem num casamento nem uma marcha nupcial numa festa de aniversário, não é?
ResponderEliminarE uma pintura pode ser uma janela para mundos maravilhosos tal como uma música...
Permita-me que diga um dos momentos mais bonitos da minha carreira de professora foi ver os olhos de uma aluna hipnoticamente presos nas Tentações de Santo Antão, de Bosch, no MNAA... Era uma aluna de Artes, cantava, dançava, pintava, tocava flauta e escrevia... É óbvio que ela tinha a chave para entrar no mundo de Bosch.
Desculpe o comentário tão longo e pouco articulado, mas é um tema que me preocupa.
Lalage,
ResponderEliminarDesculpar a extensão do comentário, essa agora!
É muito curioso que refira As Tentações de Santo Antão, porque eu própria pensei nessa obra quando escrevia esta entrada.
Aquilo de facto fascina-nos. Da última vez que fui ao MNAA os painéis estavam apenas pousados num estrado de madeira, no qual me ajoelhei para melhor absorver pormenores, ao mesmo tempo que pensava que aquilo era uma loucura. Aquela obra de valor incalculável estava ali, sem qualquer protecção, à mercê de qualquer alucinado, como aconteceu com a Pietà há muitos anos, era eu miúda. Fiquei impressionadíssima. O trabalho de restauro, monumental, levou quase dois anos, e rendeu um fascinante documentário, que muito gostaria de rever.
Recomendo-lhe a leitura deste post do 2 Dedos de Conversa e do post a que ele se refere. Acho que vai gostar muito. :)
http://conversa2.blogspot.com/2010/10/um-suave-milagre.html
Teresa, também não sou assim tão apaixonada pela obra de Paula Rego... embora não tenha prescindido de uma visita (obrigatória) à Casa das Histórias e também a histórica exposição, em 2007, no Reina Sofia, que englobava mais de duas centenas de trabalhos da pintora...
ResponderEliminar... achei é que era um excelente exemplo de uma artista que quando pinta conta-nos histórias, sobretudo naquelas obras em que retrata o nosso país ao tempo do regime de Salazar. É um exemplo, a meu ver, de como há muito conteúdo num quadro para além daquilo que podemos ver ao primeiro olhar. É a prova de como as obras de pintura são livros de história e têm muito para nos ensinar, dos tempos biblícos aos tempos actuais.
Fico muito contente que não tenhas faltado a esta última exposição da Pituxa, Teresa. Lembro-me do meu convite para a penúltima, ainda no Atelier da Politécnica, que não conseguiste apanhar. Agora viste bem o que perdeste. As cores "falam" através dela e suas espátulas e esponjas... A miuda tem o dom. Sempre teve.
ResponderEliminarDulce, concordo inteiramente com a sua visão da pintura como livros de História. :)
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