terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Mais uma partida, mais uma perda: John Barry

E esta partida e esta perda são das que mais me dizem e mais me entristecem. John Barry, o grande, o imenso John Barry partiu no domingo.

É ao som da sua música que escrevo. Entre bandas sonoras originais completas e compilações de temas vários da sua vastíssima obra, tenho um número razoável de discos.

É pobre, paupérrimo, dizer que o mundo fica mais pobre sem a música de John Barry. É um chavão estafado. Mas é também uma verdade incontestável. O mundo ficou mesmo mais pobre. Nunca mais teremos um filme com música de John Barry e o prejuízo é todo nosso.

John Barry era uma das três pessoas dessa Santíssima Trindade da música no cinema, as outras duas são John Williams e Ennio Morricone. John Barry era o mais novo dos três, partiu com 77 anos; John Williams está a uma semana de completar 79 e Ennio Morricone tem 82. E só vejo neste momento um nome para ocupar o lugar que John Barry agora deixa vago: Thomas Newman. Muito mais novo, com apenas 55 anos, tem já uma obra notável (sendo que as bandas sonoras de The Shawshank Redemption e de Angels in America são as minhas grandes favoritas). Só nomeações para o Oscar já teve dez, nunca ganhou.

John Barry e John Williams, além das incontáveis nomeações, receberam cinco Oscars. Ennio Morricone, numa surdez indesculpável da Academia, teve muitas nomeações mas nunca ganhou a estatueta. À laia de magra consolação, a Academia deu-lhe em 2007, quando já estava com 78 anos, um Oscar honorário pela carreira, suponho que motivado por um raciocínio básico: «deixa cá dar-lhe o Oscar antes que ele morra, que depois a vergonha é para nós.»

Ao longo dos anos, perdi a conta ao número de vezes que, no fim de um filme, ficava pacientemente à espera dos créditos finais, em pulgas para saber de quem era aquela música assombrosa — por mais mergulhada num filme que esteja, há uma qualquer parte de mim sempre alerta para a música. E perdi a conta ao número de vezes que li aquelas quatro palavras que ratificavam o meu instinto para a qualidade: «Music by John Barry

A banda sonora? Para mim tem de haver sempre uma banda sonora, porque a palavra e a música são dois grandes amores meus, e indissociáveis. Hoje mais ainda. Não hesitei muito, o coração chamava-me para este magnífico e dolente tema de Midnight Cowboy, de 1969. Além de que é menos conhecido do que o indescritivelmente belo tema principal de Out of Africa.

8 comentários:

  1. Bela escolha.
    (eu a tentar estar ao nível das minhas responsabilidades de crítica musical deste blogue, oh! o que havia de me acontecer)

    Agora a sério, Teresa: boa escolha.
    Ele partiu, a sua música fica connosco. Uma herança que me reconcilia com a inevitabilidade da morte. Este homem que partiu continua a enriquecer a nossa vida.

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  2. Os Oscar honorários deixam-me sempre com uma sensação agridoce...

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  3. Por acaso tinha a ideia contraria... que o Mignight Cowboy era muito mais popular, do qual varias bandas ate ja fizeram covers.

    Admito que a primeira vez que ouvi foi numa cover dos Faith No More - ultima faixa do Angel Dust(92) - e nao totalmente ma para uma banda de rock muito pesado, juro! Isto foi la pelos meus 15 anitos... e tanto amei que fui investigar a musica e dei com o filme, a BS original e O John Barry.

    De outra grande fa... os meus pesames.

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  4. Pois é, Helena, da responsabilidade já não te livras. Já não se livram, tu a Christina e o Mathias.
    Estão oficialmente nomeados por despacho imperial (de Agri e Drusi) críticos musicais da Gota.

    Quanto a John Barry, na noite em que escrevi esta entrada ouvi na íntegra as bandas sonoras de Out of Africa e Midnight Cowboy e mais duas compilações. E tens razão, ele fica connosco na música. Muitos dos temas continuarão a ouvir-se daqui a 50 anos.
    Mas é triste pensar que poderia ter-nos deixado ainda mais obra.
    Volto sempre à ideia obcecante de quantas mais obras-primas de Mozart não teríamos hoje se ele não tivesse morrido com apenas 35 anos (só aquele último ano, 1791, santo Deus!).

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  5. Julie,
    A mim também, mas mais agri do que doce. A indignação, muitas vezes, fala mais alto. À cabeça lembro-me do caso gritante de Chaplin. E de Morricone, claro.

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  6. AEnima,
    Não conheço covers de Midnight Cowboy. Referes-te à canção Everybody's Talking, cantada por Nilsson?
    E há outra que deve ser (julgo eu) também mais conhecida: Born Free (sim, o filme da nossa leoazinha). ;)
    As poucas referências a John Barry que encontrei na blogosfera só mencionavam os filmes do 007.

    Nós, grandes e verdadeiras fãs, estamos de luto.

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  7. Esse decreto imperial, Teresa! Ai que susto.
    Lembrei-me logo do Bach em Weimar: puseram-no na cadeia por ter resolvido mudar de emprego sem alterar antes o decreto ducal. O que, bem vistas as coisas, não foi tão mau: passou um mês em retiro, com pensão completa (embora a dieta fosse pouco variada), longe de barulhos e distracções (o Carl Phillip Emanuel estava na idade das birras). Aproveitou, e compôs o Cravo Bem Temperado. Bom, isso é o que dizem os de Weimar, mas tenho as minhas dúvidas, porque essa obra parece ter sido escrita cinco anos mais tarde. Embora possa ser um caso de "não fez, mas pensou".

    Mais cedo ou mais tarde morrem todos (o la Palisse não o teria dito melhor). Alegremo-nos então com os que ainda estão (olha o Manoel de Oliveira, que continua "alive and filming") e com os que virão.

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  8. Refiro-me mesmo 'a faixa Midnight Cowboy - musica. Que eu saiba em estudio ha pelo menos a cover dos Faith No More no album Angel Dust de 1992. Mas ja a ouvi ao vivo mais vezes... ainda ha poucos meses vi um concerto de Divine Comedy aqui em Bristol (veio so' o Neil Hannon e o seu piano, sem o resto da banda)tambem ele a interpretou ao vivo.

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