segunda-feira, 19 de julho de 2010

Eu, intolerante, me confesso

Detesto o substantivo tolerância, detesto o adjectivo tolerante. Quando alguém se proclama tolerante há logo qualquer coisa em mim que estremece. É inevitável para a minha mente criar logo uma imagem de arrogância, de até consigo conviver com isso. Tolerar é muito, mesmo muito diferente de aceitar. Tolerar é ainda estar a julgar, a achar que somos melhores, que nós é que sabemos, que os outros é que estão errados, nós é que fazemos o jeitinho de não levantar ondas. Tolerar é situar-se num patamar superior, do alto do qual se olha os outros, mas até se é bonzinho, até se tolera. E sentimo-nos melhores, não é reconfortante?

Mais do que em qualquer outra questão, as diferentes orientações sexuais de cada um têm sido, em muitos anos, a matéria em que mais vezes tenho esbarrado nestes vocábulos que me são odiosos. Pouco interessa que eu, por acaso, até seja heterossexual. É a minha vida, ninguém tem nada que ver com isso. Tal como ninguém tem nada que ver com a vida de quem tiver escolhas diferentes da minha. Pessoalmente, não as tolero, a essas escolhas. Aceito-as, acho-as tão naturais como as minhas, são só diferentes. Nada me interessa com quem cada um dorme, do que gosto mesmo é de ver pessoas felizes.

Mas há uma matéria em que toda eu sou rejeição, uma coisa que para mim é intolerável, e em que sou, declaradamente, intolerante. Passa pelos animais, os mais indefesos de todos. Quem maltrata animais. Quem abandona animais. A meio desta tarde surgiu-me um convite para uma viagem que seria, certamente, uma delícia. Declinei, sem qualquer espécie de pena. Tenho uma gatinha acabada de chegar a casa, na fase inicial de adaptação. Sou responsável por ela. Ser responsável por um animal não é diferente de ser responsável por um filho, acreditem em mim. É por isso que ponho aqui este cartaz. E que vos peço, na medida do possível, que o divulguem.

10 comentários:

  1. Não consigo entender que se abandone um animal, penso que isso faz de mim uma intolerante com esse tipo de comportamento. E quem diz animal diz criança ou idoso. São os mais indefesos...

    Eu também sou "responsável" por uma bichana, e a maior maldade que lhe faço é enfiá-la na caixa de transporte (que ela odeia) para a levar de férias connosco (e ela abomina andar de carro). Nem num hotel de bichos a conseguia deixar. Minha rica menina.

    É para a vida, um compromisso de amor que se assume. Quem abandona um animal também abandona a avó ou o filho. É intolerável.
    (por falar em filhos, também sou muito intolerante com aquele comportamento de entra bebé e sai bicho. tenho um amigo que anda a ver se encontra alguém para lhe ficar com a gata, porque os pelos da bicha e o bebé e tal. aspirador? hello? argh!)

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  2. Gi e Paulo,
    Sei que pensamos da mesma maneira.
    Com o Paulo, aliás, tenho tido desabafos em privado sobre uma certa criatura que anda permanentemente no FB a disseminar o seu odioso credo (isto sobre uma parte do que escrevi).
    Só por consideração a uma grande amiga comum (obviamente, a criatura não está nos nossos amigos) é que ainda não o desancámos. Mas eu já comecei a bicá-lo. Ainda ontem, num post da Diabba, tive a sorte de poder comentar logo a seguir a ele. Tive a sorte redobrada de o comentário dele ser perdido de idiota (surprise!). Para idiota, idiota e meio. Vinguei-me a comentar apenas o hilariante «Tá calada, melher!» da Bicha do Demónio. Estúpido como é, certamente terá achado que eu estava a falar com a Diabba. Com a continuação, porque daqui em diante tenciono comentá-lo sempre assim, talvez comece a ficar com dúvidas :)

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  3. I.,
    Sem dúvida. Animais, crianças e idosos. Os mais desprotegidos de todos. Mas acho que os animais ainda são os mais vulneráveis.

    Também não seria capaz de deixar as minhas pinxejas (agora outra vez duas) num hotel. Uma vez ficaram no veterinário, o extraordinário Dr. Joaquim Henriques. Messy era insuficiente renal, precisava de medicação diária. Disponibilizou-lhes a maior box, de todas, para cães de grande porte, a que, com o seu bom humor, chamou a box presidencial. Estavam juntas. E ele telefonava-me todos os dias a dar notícias delas (pelo caminho com episódios cómicos de «Olhe, saíram, acho que andam na Guerra Junqueiro às compras», ou «Posso levá-las logo ao concerto da Madonna?» Escusado será dizer, a primeira coisa que fiz quando o avião aterrou, no meu regresso, foi correr para lá para ir buscá-las (a clínica já estava fechada, mas fica sempre um enfermeiro durante a noite, a olhar pelos animais em recuperação). Atenção, estou a falar de uma viagem grande com escala, ida e volta, o hotel até recebia animais. O que eu não quis foi submetê-las à provação de umas boas dezoito horas para cada lado a viajar num porão, sei lá como. Se posso levá-las com dose mínima de desconforto para elas, vão comigo. Vê aqui como minha saudosa Messy foi de férias para o Sul de Espanha, em grande estilo, andou por ali fora, esteve em Barcelona e até voltou de avião (ao meu lado, e muito mimada por tripulação e por passageiros): http://gotaderantanplan.blogspot.com/2009/02/o-leao-de-granada.html

    Acho que encontrei a situação ideal para quando não posso levá-las: ficam em casa, no seu ambiente, uma com a outra. Pago a alguém de confiança para vir passar tempo com elas todos os dias, para renovar a areia, dar comida, mudar a água. Tem sido a minha manicure brasileira (tem o preço acrescido de lhe trazer um bom presente de viagem, um perfume, qualquer coisa assim). Mas funciona.

    A situação de entra criança/sai bicho, que tão bem assinalaste, também me horroriza. Diariamente recebo notícias de pedidos de adopção de animais por causa disso.

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  4. Já li!Valente Messy! A minha não aguenta nem dez minutos de carro. Ainda não saímos de Lisboa já ela uiva (sim, uiva, que é um miado uivado, ou um uivo miado) com todo o desespero. Do que ela gosta é de estar sogadita na sua casinha, com as suas mil caminhas (qualquer local é uma potencial caminha). Felizmente os meus pais encarregam-se da neta peluda quando estou fora. É um sossego. Ela fica no seu espaço, consoladinha, e eu sei que está bem entregue.

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  5. Paulo,
    Pois não, não resisti. Foi mais forte do que eu. Bem sabes que a criatura me põe fora de mim.

    I.,
    Não conheço gatos que gostem de andar de carro, mas Messy naquela viagem portou-se sempre lindamente (tirando uma certa parte em que começou a miar como uma doida; parámos logo que foi possível. Estendi-lhe a tacinha de água. Ná. Pus à pressa alguma areia no caixotinho e ela atirou-se lá para dentro. EStava aflita, coitadinha!).
    Mas também fiz algumas viagens para o Algarve em que ela praticamente não se calou. Já Agri não costuma manifestar-se verbalmente, põe só um ar de mártir. :)

    Beijos!

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  6. Teresa:
    este texto é de tal forma eloquente que tomei a liberdade de colocar um "link" no meu blog. Beijinhos.

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  7. Teresa,

    Nem de propósito! Detesto a palavra, de facto. Quem sou eu para tolerar seja o que for, seja quem for. Ando há que tempos a tentar escrever sobre isso! Tu disseste tudo, pronto. Partilho contigo o amor pelos animais, os meus, os teus, os dos outros e os de ninguém. Prefiro-os a muita gente e abomino quem não partilha deste afecto. Ontem, ao despedir-me dos colegas, disse que só sairia aos bocadinhos para algum lado, no máximo por 4 dias. Olharam de esguelha e indagaram porquê. Respondi que o Lucas e a Guida não gostam de viagens e não consigo deixá-los por muito tempo. Uma alminha perguntou-me se não era melhor ver-me livre deles. Não vale a pena andar-se com campanhas de sensibilização quando as pessoas não passam de grunhos.

    beijo

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