Relatório (ainda sem retratos)

A princesinha chegou ontem à noite, muito tarde, e mortalmente assustada. Está na cozinha, fechada, ela e Agri ainda nem sequer se viram. Quero-a mais calma antes de arriscar. 

Já fez dois cocós, petiscou qualquer coisinha, mas insiste em esconder-se. Já fui dar com ela atrás dos detergentes, no armário por baixo do lava-loiças. Já fui dar com ela escondida num monte de roupa para passar a ferro em cima da chaminé, já fui dar com ela escondida atrás da máquina de lavar roupa e foi uma trabalheira conseguir tirá-la de lá. Ignora a caminha-flor tão confortável, ignora a transportadora, que mantive no chão, aberta, e também muito confortável, com uma boa mantinha roubada a bordo da American Airlines (shame on me) a fazer de almofada. De hora a hora vou lá, sento-me no chão (depois de a descobrir, que a rapariga desencanta sempre novo esconderijo), pego-lhe ao colo, encosto-a ao peito, para que sinta o bater do meu coração, falo com ela baixinho, sempre a fazer-lhe festas. Há pouco, primeira vitória:  aninhou-se mais confiante na dobra do meu braço, fez ronrom, arriscou até umas tímidas turrinhas. É terrivelmente tímida, mas suspeito que vai ser uma gatinha muito meiga, uma vez vencido o medo.

Amanhã irá ao veterinário (tenho de telefonar, espero que o Dr. Joaquim Henriques não esteja de férias). Espero poder mostrar-vos em breve como é um deslumbramento de beleza. Tem o pêlo muito claro e invulgarmente longo para siamesa (há ali cruzamentos, mas o factor genético siamês é sempre muito forte), os pontos muito escuros, uma cauda farfalhuda.

E, só de olhar para ela, de ter aquele corpinho doce e morno no colo, tão frágil, tão dependente, já toda eu me sinto inundada de amor.