quarta-feira, 16 de junho de 2010

The Go-Between

«Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.»
             Álvaro de Campos, Tabacaria

Tive esta noite uma das conversas mais penosas da minha vida. Tão penosa que, devendo estar a dormir há horas, voltei para o computador, pus música, sempre a minha solução mágica, tentei fugir ao peso de tanto a que sou alheia e que vem abater-se sobre mim sem que eu tivesse querido, sem que fosse essa a minha escolha. Num assomo de mau feitio, apetecia-me pegar noutros versos do meu Álvaro de Campos, no seu Lisbon Revisited, eu que ainda ontem revisitei Brideshead:

«Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?»

Da conversa tão penosa nasceu uma ânsia de claridade, claridade que só consigo encontrar agora na pureza miraculosa dos lilases, as flores da minha paixão, como eram de Oscar Wilde, grande amor da minha vida. E sentir que se está a ser manipulada, que há recados dados em surdina, muito à vol d'oiseau, não é fácil de digerir.

A memória é coisa caprichosa. A minha memória, além de caprichosa, tem tesouros armazenados, e deles me socorro em tempos mais duros. Lembrei-me de Central City, a cidadezinha do Colorado em que o Vítor me viu em lágrimas só por causa dos lilases, que estavam por todo o lado. O Vítor ficou perplexo, sem perceber a minha reacção tão emocional, porque há coisas sobre nós que até o amigo-irmão de toda a vida pode desconhecer. Era o caso dos lilases. Como é que se conta esta paixão sem ser ridícula, e sendo a paixão, só por si, coisa fortemente candidata ao ridículo?

Não aprofundámos a questão dos lilases entre nós. Cortei um cacho daquele esplendoroso arbusto frente ao tribunal, viajou connosco, no meu colo, durante centenas de quilómetros. O Vítor, ao volante, ia pedindo para cheirar, apaixonado pelo perfume mágico. De cada vez que lhe punha o cacho debaixo do nariz tinha vontade de chorar, nunca tinha partilhado os lilases com ninguém.

E agora perdi-me, e nem sei onde queria chegar com isto, só sei que me agarrei à beleza do lilás da minha infância como a uma âncora de salvação.

E tudo isto é tão absurdo que, pela primeira vez em muitos anos, dou comigo a sentir-me sozinha. Daí a música. Se não perceberem italiano... azarzinho. Mas talvez tenha mesmo passado muito, demasiado tempo desde a última vez que senti alguma coisa por alguém. E se calhar até seria bom conseguir voltar a sentir alguma coisa. Ou não.


ADENDA: A insónia atacou forte e feio, o dia de amanhã anuncia-se complicado. Mas há coisas que apaziguam e consolam, coisas que não têm preço.  Poucos minutos depois de publicar esta entrada confusa, recebi um sms de uma amiga: « Posso ajudar em alguma coisa?»
Quem me dera que pudesse! E que difícil é explicar que não sou eu quem tem problemas, que são os problemas alheios que vêm assombrar-me. 
Mas também não é isso,  quando se é amigo os problemas passam a ser também nossos, nunca são alheios. E estou metida numa camisa de onze varas.

Toto Cutugno - Da Poco Tempo Che

«Da troppo tempo che
non nasce più un fiore
nel giardino dellamore
Da troppo tempo che
non batte più un cuore
nella casa dellamore
da troppo tempo che
nei giorni sempre uguali
vivo, vivo io
e non mi basta più
la donna più speciale
se non lamo io.
Da poco tempo che riesco a far lamore
con la testa e con il cuore
da poco tempo che
con te dopo lamore
stiamo li per ore ed ore
da poco tempo che
noi stiamo bene insieme
come voglio io
e un emozione in più
un sentimento vero
e dentro di me
na na na na na
va, che grande tu
che donna tu
che bella tu
che amante tu
violenta tu
che dolce tu
ribelle tu fra le mie mani
io ti scherzo per strada
ti porto la spesa
ti bacio ti gioco
ti porgo una rosa
ti vedo in vetrina
vestita da sposa
che pazzo con te è un altra cosa
e con te e con te
e con te e con te.
Da poco tempo che sto veramente bene
senza angoscie e senza pene
da poco tempo che
io non ho più paura
il gelo e qui fra queste mura
da poco tempo che
noi stiamo bene insieme
come voglio io
un emozione in più
un sentimento vero
e dentro di me
na na na na na
va, che grande tu
che donna tu
che bella tu
che amante tu
violenta tu
che dolce tu
ribelle tu fra le mia mani
io ti scherzo per strada
ti porto la spesa
ti bacio ti gioco
ti porgo una rosa
ti vedo in vetrina
vestita da sposa
che pazzo con te è un altra cosa
va, amare sognare
parlare. giocare
tremare, piacere di fare lamore
e poi respirare
sentire il cuore
che vive, che scoppia damore.
»