Life imitates Art
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A morte de Natasha Richardson perturbou-nos demasiado aos dois. Principalmente porque era impossível dissociar aquela terrível perda, a mais dura que um ser humano pode sofrer, a perda de um filho, da perda de Joan Didion a que Dame Vanessa tinha dado voz. A vida a imitar a arte. «Life imitates Art far more than Art imitates Life», nas palavras do meu amado Oscar Wilde.
Natasha Richardson, a nossa inesquecível Sally Bowles do Cabaret de Sam Mendes, teve uma morte absurda, a 18 de Março do ano passado. Condoemo-nos indizivelmente do sofrimento de Vanessa Redgrave. Um ano mais tarde, a seis de Abril, parte Corin Redgrave, o irmão, com 70 anos. Menos de um mês depois, ontem, foi a vez de Lynn, a irmã, aos 67. O Teatro está hoje de luto. É um lugar-comum, mas é terrivelmente verdadeiro, tão grande é a importância da dinastia Redgrave. Vanessa era a mais velha dos três irmãos, com 73 anos.
E eu tenho uma compaixão infinita pela sua dor esta noite, dor que nem consigo começar a imaginar, somatório de dores tremendas e sucessivas, mal a deixando respirar, ao longo de um único ano. The Year of Magical Thinking — como se, ao vestir a pele de Joan Didion em palco, ao dar-lhe voz, tivesse atraído para si perdas igualmente terríficas. A seguir à morte de Natasha tive a certeza de que ela nunca mais conseguiria levar aquele papel ao palco, tão desgarradoramente pessoal o texto se tinha tornado. Enganava-me, aparentemente, houve notícias no meio teatral de que voltaria a fazê-la (e eu estaria lá, nem que fosse em Asunción, Paraguai). Não pelo morbo (eloquente substantivo castelhano para o qual não encontro tradução que me satisfaça), mas para render homenagem a uma verdadeira heroína. Agora tenho a certeza absoluta e definitiva de que Dame Vanessa não voltará a dizer em palco o monólogo de mais de hora e meia que esta noite deve passar-lhe inteiro na cabeça, uma e outra vez, todo aquele revolver da perda, das perdas tremendas. Lembro o seu gesto tão espontâneo e caloroso, a afagar-me o pulso em agradecimento da emoção que sentiu genuína, aquele «Thank you. Thank you.» A Vida imita a Arte, sim. Mas esta noite ela é só a mãe e a irmã, respeitemos. E é por isso que prefiro que desta vez se lixe a Arte e que o mundo perca mais uma extraordinária representação de Dame Vanessa Redgrave (que muito boa gente, que sabe bem mais disto do que eu, considera a maior actriz de palco viva). Tenho tanta, tanta, tanta pena!
Natasha Richardson e Vanessa Redgrave, Evening
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