Love Song to a Stranger
Joan Baez canta esta noite em Lisboa e eu não estou no Coliseu, por decisão consciente, por não querer macular a lembrança mágica daquela noite de 2 de Agosto de 1980, dos meus 19 quase 20 anos, eu sentada no chão na primeira fila do Dramático de Cascais, as lágrimas a correrem numas bochechas muito lisas e frescas. Joan Baez foi de tal forma omnipresente na minha adolescência que aquele encontro funcionou um pouco como a conclusão oficial desses anos tão felizes e tão cheios. Para a frente vinham tempos duros, muito sofrimento, coisas que à época eu não poderia ter pressentido. Três anos mais tarde, quando Joan Baez voltou a cantar em Portugal, lá estava eu outra vez, mais velha, já com cicatrizes, mas continuando sempre com uma fé inabalável nas palavras do poema de Dylan que ela voltou a cantar, aquele maravilhoso Forever Young que tanto continua a comover-me. O concerto decepcionou-me terrivelmente. De repente lembrei-me dos versos de Álvaro de Campos sobre Portugal, sobre sermos um povo que ficou sem trabalho depois de descoberta a Índia. Joan Baez, acabada a guerra do Vietname, andava à deriva, à procura de uma causa. Pior ainda, foi nessa noite que descobri a sua nunca resolvida obsessão por Dylan. Ouvi-la cantar uma coisa patética e de qualidade abaixo de zero chamada Children of the Eighties, parte do seu disco mais recente, exasperou-me. Um certo verso, que ainda lembro perfeitamente (e nunca mais voltei a ouvir tal coisa, graças a Deus), até me fez revirar os olhos: «And we don't care if Dylan's gone to Christ.» Só me apeteceu gritar-lhe «Ó mulher, get over it already! Ele até te trocou pela Judy Collins!»
Não, foi mesmo melhor não ter ido esta noite ao Coliseu (sala que, de resto, abomino — pior só mesmo o Pavilhão Atlântico). Tenho os tantos discos, a voz linda, isso anda sempre comigo. E esta Love Song to A Stranger, uma das músicas da minha vida, que continua a comover-me tanto hoje como na primeira vez que a ouvi. Letra e música dela. A contarem uma história verdadeira, como fiquei a saber pela sua autobiografia, And A Voice To Sing With, que o M. me trouxe há muitos anos de uma viagem de trabalho ao Canadá, a mesma que pegava com uma abortada ida nossa a NY, que tivemos de trocar por... Cantanhede. Isto só comigo!
O bilhete à esquerda não é meu, é de uma Old Soul também presente no concerto, só viríamos a conhecer-nos quase trinta anos depois, não é curioso?
Love Song to A Stranger
How long since I've spent a whole night in a twin bed with a stranger
His warm arms all around me?
How long since I've gazed into dark eyes that melted my soul down
To a place where it longs to be?
All of your history has little to do with your face
You're mainly a mystery with violins filling in space
You stood in the nude by the mirror and picked out a rose
From the bouquet in our hotel
And lay down beside me again and I watched the rose
On the pillow as it fell
I sank and I slept in a twilight with only one care
To know that when day broke and I woke that you'd still be there
The hours for once they passed slowly, unendingly by
Like a sweet breeze on a field
Your gentleness came down upon me and I guess I thanked you
When you caused me to yield
We spoke not a sentence, took not a footstep beyond
Our two days together which seemingly soon would be gone
Don't tell me of love everlasting and other sad dreams
I don't want to hear
Just tell me of passionate strangers who rescue each other
From a lifetime of cares
Because if love means forever, expecting nothing returned
Then I hope I'll be given another whole lifetime to learn
Because you gave to me oh so many things it makes me wonder
How they could belong to me
And I gave you only my dark eyes that melted your soul down
To a place where it longs to be
Só soube agora, ao ler este post, e não podia ir ouvi-la de qualquer maneira, mas tenho alguma pena. Nunca a ouvi ao vivo, e um amigo que a reviu há poucos meses, na Escócia, gostou muito.
ResponderEliminarO Coliseu é péssimo, concordo. E ao Pavilhão Atlântico espero nunca mais voltar.
ResponderEliminarTambém recordo o enlevo com que ouvia música ao vivo na adolescência e, por vezes, custa-me a compreender a saudade e uma ou outra lágrima...afinal o presente não é assim tão mau! Mas a razão talvez seja mesmo essa, a inconsciência, mais, a incredulidade no facto de a vida daí para a frente poder não continuar a ser tão maravilhosa assim!Acho que é deste ´"nós mesmas" que sentimos saudade...porque a música podemos sempre ouvir!
ResponderEliminarQuando a viste ao vivo pela primeira vez, eu ainda não tinha nascido. Mas descobri-a mais ou menos com essa idade, pela mão e discos do meu pai. Não ousei ir vê-la. Há coisas que devem preservar uma certa magia. =)
ResponderEliminarEu também não fui ver JOAN BAEZ ... já vi e revi e nunca esqueço aquela voz em Joe Hill e Farewell Angelina ....mas são tantas e tamanhas que não valia a pena o risco de ir ao Coliseu, sei que entrou ( ao contário do que diz o escriba do Público....) gloriosamente com Lilly of the West de Dylan e que até cantou Grandola Vila Morena (...) prefiro ficar eternamente jovem e recordar aquele chão de Cascais a poucos metros de ti, mais ou menos 30 anos de metros que ficaram perto, Graças à Vida.
ResponderEliminarGi,
ResponderEliminarNo teu caso percebo. Mas quem é da minha idade e foi veio de lá triste. Temos os discos, não tenhas pena.
Cláudia,
Não tenho a certeza de ser só isso, de tentarmos ainda ver-nos com os olhos desse tempo. Há casos em que há mais qualquer coisa, e este é um deles. Um de muitos, graças a Deus.
Beijos às duas.
Ana,
ResponderEliminarFizeste bem em não ir. Não foi timidez, medo de ousar. Foi prudência. Preservaste a magia. Essa sim, continua connosco.
Old Soul,
Pois é. Os mais ou menos 30 anos de metros ficaram próximos. Gracias a la vida, que nos ha dado tanto! :)
Beijo aos dois.