sábado, 19 de julho de 2008

Leonard Cohen: é hoje!

E a minha decisão de não ir (tive bilhetes de primeira água oferecidos) é lúcida, consciente. É claro que não seria eu se não me debatesse com uma dúvida incómoda, insidiosa: e se?... Agradeço de todo o coração aos comentadores que, lá muito para trás, se insurgiram com as minhas dúvidas e me instaram a ir, não fosse arrepender-me mais tarde.

Não vou, meus amigos, e a escolha é minha. Leonard Cohen é para mim tão sagrado que não suportaria ouvi-lo num sítio que, mesmo não o conhecendo, me suscita fortes suspeitas. A música de Leonard Cohen é tão intimista que não é admissível ouvi-la em sítios tão esdrúxulos como aquele Pavilhão Atlântico (que devia levar com uma bomba Antónia em cima, mas isto é tão-somente a minha opinião) ou este Passeio Marítimo de Algés. Repito que não conheço o sítio, mas à partida cheira-me a coisa tão dissonante de Leonard Cohen que até dói. E eu tenho os discos todos, os originais...

Tive comentadores a instarem-me a ir ao concerto, e comentaram aqui apenas dessa vez, quando falei do primeiro concerto de Leonard Cohen, a 18 de Feveiro de 1985. Kiko e Blue Bird, não levem a mal, acreditem que ponderei tudo! A Sofia e o Huckleberry Friend estarão lá hoje, e quero que seja mágico para eles, será o seu primeiro e quase seguramente último encontro com o grande senhor.

Escolhi não ir. Há memórias que devemos manter intocadas, tão preciosas são. É o caso da minha memória mágica daquele 18 de Fevereiro de 1985, quando a Sofia ainda nem estava neste mundo. Sofia, querida, é o teu tempo de armazenar memórias, que seja como sonhaste!

Deixo aqui uma das mais belas músicas de Leonard Cohen, o meu «Álvaro de Campos cantado» (a Ana e a Sofia, duas senhoras com uma sensibilidade toda especial para a Poesia, aprovaram a definição, como tal não deve ser completamente disparatada), uma música que, seguramente, ninguém vai ouvir esta noite, disso tenho a certeza. Sei que ele não vai cantá-la, sei porque o percebo muito bem. A música chama-se Seems So Long Ago, Nancy e deixa-me sempre com um aperto na garganta. Obrigada, Vítor, por me teres oferecido Songs from a Room quando tínhamos vinte anos... Foram muitas noites insones, foram muitas lágrimas a ouvi-lo. Diria que Leonard Cohen é na minha vida tão importante como tu ou Mozart. Ou como os Beatles ou Simon & Garfunkel. E também como os Mamas & Papas e Peter, Paul & Mary... Diabos, eu devo ter mesmo infinitas capacidades de paixão! :)

3 comentários:

  1. Parece que não fomos pelo mesmo motivo. Por mais extraordinário que ele seja, vê-lo num festival, associado a pó, casas de banho infectas, excessos de álcool e coisa do género, não é de todo o que eu já imaginei...

    ResponderEliminar
  2. Olá Teresa! Compreendo a sua decisão e respeito-a, eu tinha que ir, fiquei mesmo na frente a 3 m dele e quando às 21.00 em ponto entrou em palco e começou de rompante o "Dance me to the end of love" (que pelo que me apercebi nem é de perto nem de longe uma das suas preferidas),as lágrimas começaram-me a correr pelo rosto abaixo, eu não era o único assim, olhava à minha volta e via outras pessoas no mesmo estado, raparigas de vinte e poucos anos a cantar baixinho a letra com a mão direita no coração...aquela entrada foi letal acredite, Cohen ajoelhado a cantar "show me slowly what I only known the limits of...", depois durante o concerto não se ouvia uma única palavra tamanho era a devoção com se escutava cada linha de cada canção. O Cohen apenas nos olhava, com um olhar tão humano quanto comovente e sorria, sorria como uma criança, e sentia-se ali qualquer coisa que não sei explicar, algo muito grande mesmo. Depois foi o desfilar de todas as canções que já sabemos "Bird on a wire", "Gypsy's Wife" divinal, "Hey, that's no way to say goodbye", "Suzanne" teve logo uma grande ovação claro, etc... no final, no último encore ainda ousei pedir bem alto e a pulmões abertos "Famous Blue Raincoat" (a minha canção de culto), tenho quase a certeza que ouviu, pois sorriu uma vez mais mas começou logo "I tried to leave you", no final quando virou as costas e se dirigiu para a saída do palco, as lágrimas voltaram a cair-me...tinha acabado. Depois olhando à minha volta e observando o rosto das pessoas, notei um misto de alegria por aquilo que tinham acabado de assistir mas ao mesmo tempo um olhar triste, vago e perdido por saber que Cohen tinha partido para se calhar nunca mais voltar...

    Blue Bird

    ResponderEliminar