sábado, 3 de maio de 2008

Rui Pedro, o parente pobre

O texto é da Ana, no seu brilhante Porta do Vento. Reproduzo-o na íntegra. Julgo que estou dispensada de explicar porquê.

Sempre que o "caso Maddie" me invade a casa, numa esquizofrenia mediática que roça a loucura colectiva, tenho vontade de relembrar este outro caso, o do Rui Pedro. Passado igualmente por cá, debaixo do nosso nariz português, mas com gente que, infelizmente, não tem o mesmo poder de captar a atenção do mundo e as verbas milionárias que são precisas para se manter na ribalta das notícias.

Não há um casal fotogénico nem uns bonecos gémeos loirinhos, para a fotografia. Não há aberturas de telejornais. Não há audiência com o Papa, nem nas Nações Unidas. Não há tablóides ingleses a obrigar a nossa Judiciária a puxar pelos galões. Não há uma Fundação. Não há um encarte no último Harry Potter, de tiragens que se multiplicam até ao infinito. Não há missas, nem nannies, nem advogados a pôr-se em bicos de pés para ficar com o caso. Não há nada, praticamente, pelo menos que se veja.

Há só uma mãe desesperada, que não desiste. E a consciência dessa desigualdade obriga-me a este acto de mera justiça e solidariedade - colaborar nesta campanha.
Tenho assistido, como todos os que quiserem reparar nisso, à incessante batalha desta mãe, impotente mas nunca vencida. Sem recursos, sem divulgação mediática internacional (mesmo a nacional tem sido quase inexistente), sem apoios de nenhuma espécie, a mãe do Rui Pedro não permite - sempre que lho permitem a ela - que nos esqueçamos do seu filho desaparecido. Uma mulher bonita que envelheceu à nossa vista, corajosamente exposta e inconformada.

Sei que este não é o único caso de crianças portuguesas desaparecidas, longe disso. Mas a imagem desta mãe, devastada pelo desgosto e pela expectativa interminável, atira-me à cara a sorte que tive em ter acompanhado o crescimento dos meus filhos e tê-los tido sempre por perto. A mãe do Rui Pedro apenas pode imaginar, auxiliada por um retrato robot feito por um computador, como será (ou seria?) o seu filho agora. E esse simples pensamento já é insuportável.

Aqui fica, por isso, o meu humilde contributo.

6 comentários:

  1. Pelo menos nao foi acusada do crime

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  2. É a igualdade que (não) temos. Curioso, porque hoje, ao ver o telejornal lembrei-me desta mãe e do caso, da impotência, do sofrimento atroz porque deve passar todos os dias. O não saber, a incerteza deve ser o que mais dói.
    anónimo: se calhar preferia ter sido acusada, era sinal de que se estava a fazer alguma investigação.

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  3. Teresa, com a irritação da overdose de Maddie (coitadinha, tenho a maior pena da criança, que é quem não tem culpa nenhuma) escrevi mal "nannies". Por favor emenda, ok? Neste texto é o menos importante, mas não gosto de erros.

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  4. Pois...
    Trabalhei por algum tempo aqui no Brasil (sabem bem quanto somos, quanta pobreza e desigualdade, postanto suponham que possam imaginar o número de casos "anônimos" de desaparecimentos) com uma ONG que dava apoio a mães que tinham perdido seus filhos ou que lhes tinham mesmo sido roubados e que, passam anos, a grande maioria sem encontrá-los... É de partir o coração! Hoje temos no Brasil um caso que me lembrou a história de Maddie, pois estive aí em Lisboa logo após o acontecido no Algarve e a TV só falava disso... Este aqui - o grande "prato jornalístico da nossa TV" é da menina Isabella, encontrada jogada pela janela do próprio apartamento... A polícia julga que o pai e a madrasta sejam os principais suspeitos, eles negam... assim como os pais de Maddie e dizem que não vão descansar enquanto nao encontrarem "os responsáveis"... Virou caso de polícia e assunto para a mídia incansável em martelar todas as possibilidades. Mas neste caso, há corpo: há uma menina... de 5 anos, morta, possivelmente pela madrasta e o pai e atirada pela janela... Meu Deus, que mundo é este em que vivemos? Fica aqui também o meu abraço solidário a todas as mães que perderam contacto com seus filhos. Que tenham fé, lutem por encontrá-los e contem com nosso melhor pensamento para que estejam vivos e a salvo.

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  5. Anónimo,
    Até concordo com a Moi Chérie, se bem que a cada ano que passou o rasto fique mais ténue e impossível de encontrar.

    Moi Chérie,
    Acho que nem é preciso ser mãe para imaginar o sofrimento atroz. E que não encontra alívio. Ela chora a perda do filho e a imaginação deve ir sempre à frente, a visualizá-lo em cada rapaz da idade dele com que se cruza todos os dias na rua.

    Ana,
    Quando li o teu texto... escapou-me (a revisora devia estar de folga). Copiei e publiquei sem reler, tal a confiança que tenho nos teus escritos :)

    Mas já está corrigido. E fica a lição de humildade...

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  6. CoRa,
    Lembro-me de ter lido há muitos anos, talvez uns 17, uma extensa reportagem sobre crianças desaparecidas no Brasil. Havendo tantos meninos na rua (os Capitães da Areia :(), há margem para horrores que aqui em Portugal, apesar de tudo, é mais difícil que se verifiquem.

    A tal reportagem noticiava a descoberta aterradora de uma grande vala com os corpos de muitas crianças. A todas tinham sido tirados os olhos e julgo que mais alguns órgãos - o que levava a pensar que tinham sido raptadas exclusivamente com esse objectivo. Lembro-me de ter chorado perdidamente a ler aquilo. O direito a uma infância segura, protegida e feliz é para mim sagrado. Pobres, pobres crianças!
    Grande beijo.

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