domingo, 9 de setembro de 2007

Luciano Pavarotti & Mirella Freni*

* Aviso à navegação: este post é para amantes da Ópera. The Ultimate Art, como lhe chamou David Littlejohn num livro que já reli muitas vezes, num encantamento renovado em cada reencontro. A sua leitura está aberta a todos, evidentemente. Gosto de partilhar, uns quantos já vão sabendo disso. A Ópera é um dos maiores tesouros da minha vida.

Ele foi há poucas horas a enterrar. Ela, a amiga querida de sempre, de uma vida inteira, aposto que atravessa uma noite insone, a lembrar histórias comuns. Recomendo a todos o post do José Quintela Soares no seu Opera per Tutti e a sua conclusão: «A preto (do luto) e branco (do lenço)». Que linda legenda para a fotografia que ilustra o post, José! Gostava de a ter escrito. Li muitos posts sobre Pavarotti nos últimos dias, em blogues diversos. O José e eu fomos os únicos a assinalar o corte brutal desta parceria que fica para a história. Luciano e Mirella, as crianças de Modena que o canto fez ídolos do mundo. Ela, viúva de um baixo que, também ele e muito justamente, é toda uma lenda (Nicolai Ghiaurov, morreu em 2004), fez escolhas diferentes. Retirou-se quando a voz ainda podia durar mais, nunca se vendeu às contas de somar. E se a tentação pode ser forte...

Pavarotti e Freni gravaram a Bohème perfeita. Em 1970, sob a batuta do grande Karajan. Encontrei no Youtube a sequência completa, gravada ao vivo vinte anos depois.

Para os menos familiarizados com a Ópera, eis uma explicação sumária (e muito pessoal): aquilo que agora aqui deixo é um maravilhoso fresco do nascimento de um amor. Que vai correr mal, como quase todos correm. Isso era novidade na Ópera, esta La Bohème insere-se numa corrente chamada Verismo, que pretende ser mais realista (verdadeira) e retratar pessoas reais em situações reais. No fim ela volta para morrer nos braços dele. Verismo... ma non troppo... certas convenções operáticas são demasiado fortes: ópera que se preze acaba com a morte dos dois amantes ou, pelo menos, de um deles.

Para quem nunca ouviu nada de Ópera e tenha alguma curiosidade, esta é uma excelente escolha para se iniciar. Por razões várias. Para começar, é uma ópera muito curta (reza a lenda que a família real britânica, quando tem visitantes de Estado estrangeiros que quer obsequiar com uma noite no Covent Garden - Royal Opera House, dá sempre preferência à Bohème... precisamente por ser curta); a sua construção em quatro actos faz-me pensar na estrutura mais tradicional de uma sinfonia, em quatro andamentos. A música de Puccini é arrebatadora e tão acessível que entra imediatamente no ouvido. Outra boa escolha para uma primeira incursão nesse jardim encantado que é a Ópera será, a meu ver, o Rigoletto, de Verdi. Nesta versão, a minha preferida - vejam só quem são os cantores...

As três cenas que aqui ficam conseguem, ainda hoje, pôr-me a chorar de felicidade, tamanha a beleza. Ele apresenta-se (1.ª ária, Che Gelida Manina), ela responde (2.ª ária, Si, Mi Chiamano Mimi), segue-se o sublime dueto O Soave Fanciulla.

Se alguém conseguir ver estas três cenas e continuar sem perceber por que razão a Ópera é um dos grandes amores da minha vida... lamento, mas só pode ser muito estúpido. Ou insensível. Ou surdo. A ordem é perfeitamente arbitrária.

Che Gelida Manina (Rodolfo, Luciano Pavarotti)



Si, Mi Chiamano Mimi (Mimi, Mirella Freni)*

* Tenho muitas versões desta ária. Algumas delas por cantoras que são imortais. Nenhuma a canta como a minha menina Freni. Há quatro cantoras por quem tenho uma paixão avassaladora: Dame Joan Sutherland (primeiríssima), Elisabeth Schwarzkopf, Edita Gruberova. E ela, a minha menina Freni. Um certo verso da ária faz toda a diferença. Ninguém o canta como ela. Nem sequer a maravilhosa Renata Tebaldi, outro dos meus ídolos, a voz de anjo, como lhe chamavam.


O Soave Fanciulla (Rodolfo e Mimi)

7 comentários:

  1. Nunca fui ver uma ópera :(
    Mas acho que ia gostar ...

    ps- Quanto a responder aos comentários ...
    ...eu tenho todos os blogs que já me comentaram linkados no reader e tenho o cuidado (eo prazer também) de os visitar e comentar ...
    ... a partir de hoje vou tentar responder também aos comentários... prometo! Obrigado pela dica.

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  2. NANI,
    Tu achas que ias gostar. Eu tenho a certeza de que ias ADORAR (já fiz a experiência com várias pessoas).

    Parece-me que és uma rapariga cheia de sorte. Vai à página de São Carlos (http://www.saocarlos.pt/), abrem a temporada justamente com o Rigoletto, uma das óperas que eu recomendo para iniciados.

    Dois conselhos de pessoa experiente nestas andanças:

    1. Tenta arranjar bilhetes com antecedência, a qualidade dos lugares é FUNDAMENTAL (eu sou uma esquisita do pior). Se tiveres dificuldade, manda-me um mail, talvez possa ajudar, uma das minhas melhores amigas é assistente de cena em São Carlos.

    2. Compra a ópera e ouve-a antes. Se os teus ouvidos já estiverem familiarizados com ela (e o Rigoletto, além de LINDO, é FACÍLIMO - aposto que conheces o La Donn È Mobile, toda a gente conhece, sem saber que é uma ária do último acto), a tua primeira experiência ao vivo vai ser electrizante, prometo.

    Se nos cruzarmos lá na mesma noite vais ver-me numa triste figura: olhos inchados de tanto chorar, nos duetos da Gilda com o pai.

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  3. Cara Teresa,

    Obrigado por recomendares o S.Carlos à mnha mais que tudo. A ópera vai sair caríssima (moramos no Porto...).

    Chegou-me um recado teu e em consequência respondi já a TODOS os comentários nos meus dois últimos posts.

    Beijo

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  4. Apesar de eu não ter gostado dos atributos com que terminou o post, não tenho problema em assumir que gosto de ópera, tenho a mesma versão dos 3 vídeos que apresentou e as vozes de Freni e Pavarotti são o máximo nesta gravação. La Bohème não é a minha ópera favorita de Puccini, gosto mais da Tosca e até mesmo da Turandot, que me parece estranha, muito difícil de cantar e menos sentimental. E como gostos não se discutem, sou mais Wagneriano do que de Puccini ou Verdi, mas tenho de reconhecer que para se ouvir uma voz com toda a sua potência é nas óperas italianas de Verdi e Puccini(embora das italianas a minha favorita seja a Norma). Nas alemãs a música parece-me ser tecnicamente mais elaborada e a voz mais um complemento, mas com grande exigência técnica e claro está, menos românticas. Mas continuo com o sonho de um dia conseguir um bilhete para o S. Carlos quando estiver em Lisboa. Londres, Berlim, Viena, Montreal e Nova Iorque já consegui bilhetes, Lisboa desde que passei admirar ópera never... embora tenha visto há muitos anos a Tosca no Coliseu (a minha primeira vez ao vivo numa óperaO

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  5. ALF,
    Eu sei que tu e a Nani moram no Porto :)
    Mas concordarás certamente que será um programa giríssimo. E diferente.

    E reparei que passaste a responder aos comentários. Registo e acho muitíssimo simpático. Aposto que no fundo tu também. Às vezes somos apenas desatentos. Eu tive óptimos professores na blogosfera, regi-me pelo comportamento deles, e até hoje nunca me arrependi.
    Um beijo.

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  6. GEOCRUSOE,

    O seu comentário dá margem para uma longuíssima resposta, ainda mais para mim, que tenho um problema com a escrita: o vício dos quilómetros de letras.

    Já me penitenciei em particular com uma das Cangalheiras, que me chamou a atenção justamente para isso de que me acusa com toda a justiça. Tem razão, tem toda a razão, e peço desculpa. A si e a todos os que leram o post. Não era minha intenção melindrar ninguém, e reconheço que fui grosseira. A única atenuante que encontro é o facto de a minha paixão por ópera ser imensa, e não ter medido as palavras. Quando falo de coisas que me são verdadeiramente queridas, deixo-me inflamar e acabo por me exceder. Peço humildemente desculpa, a si e a todos. Excedi-me.

    Quanto ao resto... prefiro a Bohème à Tosca (que acho uma ópera magnífica..., note bem). Numa coisa estamos de acordo. A Norma. A Norma entrerá sempre nas minhas 10 óperas favoritas. Muitos anos e muitas audições depois, continua a fazer-me chorar baba e ranho. Qual é a sua gravação preferida? Eu tenho várias, mas oiço sempre a mesma: aquele par único e mágico, Dame Joan e Marylin Horne. Se aquilo não é sublime, o conceito de sublime ainda está para ser inventado! Tão perfeitas são as vozes, tão bem se casam, se entrelaçam, se misturam... que a certos momentos tenho dificuldade em saber qual é qual. E o final? Ai, o final...! A partir do "Qual cuor tradisti" eu já não choro: soluço! E quando o Polione canta "Moriamo insieme, ah si moriamo, sublime donna io t'ho perduta" (não juro pela ortografia, que o italiano que sei vem-me da ópera, seja indulgente). E há um certo momento instrumental no último acto, um leve arpejo, que eu, que sei a ópera inteira de cor, estou sempre a preparar-me para ouvir, e oiço sempre com emoção renovada.

    Tenho paixão por bel canto, como tal só posso idolatrar Bellini. Talvez os "Puritani" tenham maior qualidade musical, mas a "Norma" arranca-me emoções fortíssimas. E ela é uma mulher de carne e osso, coisa extraordinária e com poucos paralelos.

    E agora tenho mesmo de acabar, que estou a cabecear de sono.

    Um beijo para si.

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  7. Pode escrever à vontade que gosto de ler.
    A gravação que tenho da Norma, tem algumas imperfeições e é com Joan Sutherland e Troyanos, mas confesso que a comprei mais por ser uma interpretação na Canadian Opera Company que no momento da compra estava a instalar-se na rua onde eu estava a passar mais uma das minhas férias em Toronto. Mas Sutherland já estava a ficar no ocaso da sua voz. Mas se nada ocorrer de imprevisto, espero em Novembro voltar a ver a Norma no Mets em NY, com Maria Guleghina. Há uns anos a esta parte as minhas férias são sempre em função de uma ópera (casa) e este ano escolhi NY, uma vez que nesse período em Toronto nada de especial se irá passar e já lá estive, assim dou um salto a atravesso a fronteira uns dias. Mas só comecei a comprar óperas completas desde o aparecimento do DVD, o que faz com que a minha colecção seja de poucas dezenas de obras. Quanto ao S. Carlos está-me atravessado pois, raramente vou a Lisboa com data marcada a longo prazo e por isso quando vou, bilhetes já não encontro ou não há representação... mas em Viena, Berlim, Londres e Montreal comprei sempre bilhetes no local, para além daquele que adquirira antes e assim nunca fiquei limitado a um único espectáculo. Mas cada vez gosto mais de ópera e do Lied alemão, um pouco mais intimista mas deliro com a música e alguns interpretes.

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