quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Limites de privacidade

A discussão vai acesa no blogue da Izzie. Agora questiona-se a legitimidade de uma professora de escola secundária para digitalizar livros de ponto dos anos 80, disponibilizando-os no Facebook. Devo dizer que nem sequer conheço pormenores, apenas suponho que a senhora o terá feito com a melhor das intenções, a de disponibilizar memórias ternurentas a antigos alunos. Acresce que as fotografias nem sequer nomes têm, apenas números, o que é substancialmente diferente do que deu início à acalorada discussão.

Não querendo arvorar-me em paladina da moralidade, há mesmo coisas que temos de respeitar. Coisas, pessoas e a sua intimidade. Quando aqui publiquei retratos felizes dos meus queridos amigos Leninha e João, que se reencontraram e casaram ao fim de mais de trinta anos, foi com pleno consentimento deles, e tive o cuidado de tapar as caras dos quatro filhos dos dois.

Outro tanto aconteceu há coisa de dois anos e pouco, aquando do centenário do meu querido Liceu e estava em preparação um livro comemorativo (Liceu de Camões — 100 Anos, 100 Testemunhos). O editor, também antigo aluno e que tinha sido meu professor na Católica, pediu-me para aceder ao blogue que tenho para o grupo que ainda hoje mantém jantares trimestrais (à época já o tinha privatizado, para proteger a privacidade dos membros). E gostou muito de algumas fotografias, que por sinal até eram todas minhas. E pediu-me autorização para as usar no livro, indicando-as uma a uma. Só depois de fazer a ronda de todas as pessoas que nelas figuravam, para saber se concordavam, dei luz verde. As fotografias eram minhas, é certo. Mas retratavam pessoas que podiam não gostar de se ver no livro. Todas concordaram alegremente (tudo pelo nosso Liceu!), até há uma minha com o meu primeiro namorado que é uma perfeita ternura. E o blogue consta dos agradecimentos do livro. Que é belíssimo, nunca me cansarei de repetir.

Parece-me ser esta a maneira correcta de fazer as coisas. Estarei enganada?

14 comentários:

  1. Acho que está certa. Pelo menos eu faço o mesmo, quando torno públicas fotos que não são minhas (e até videos) faço-o sempre com a permissão de todos os que nelas aparecem.

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  2. Os livros de ponto nada têm de mal... como disseste, nem nomes têm. Por exemplo, não entendi lá muito bem o texto do Arrumadinho (que gosto de ler). Não achei nada admissível o facto de ter espetado o nome das colegas... alegadamente porque não o lêem. Elas podem não ler... mas lêem milhares de portugueses.

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    1. E lêem acima de tudo os motores de busca, que adoram os blogues. Daqui a um mês ou dois, não há pesquisa do Google por aqueles nomes que não vá dar ali, o que é efetivamente determinante e potencialmente danoso para a reputação das pessoas, online e offline.

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    2. Exactamente, Rita. Os blogues aparecem sempre à cabeça nos resultados das pesquisas.

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    3. Eu a certa altura fui um dos primeiros resultados da pesquisa por homens nús - nunca tive tantas visitas e nunca desiludi tanta gente :)

      (também sou muito popular junto de brasileiras à procura de informação sobre homens alemães)

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    4. Rita, experimenta ir ao Google pesquisar "Ana Zanatti nua", que durante anos foi a campeã das visitas parvas que me apareciam. Acabaraia por ser destronada por "Roberto Leal", ainda hoje o post mais visitado da Gota, como podes ver na barra lateral.
      Se isto não é vergonha, o conceito de vergonha tem de ser reinventado.

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    5. A "Ana Zanatti nua" já não encontrei mas já fui ver o post do Roberto Leal (como minhota estou a ponderar ficar ofendida, só ainda não decidi se é contigo ou com o Roberto Leal). Depois sempre chegaste a contar a história do autógrafo? Deve ser deliciosa.

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    6. Bem sei que já não consegues ouvir a música, mas se pedires com jeitinho eu mando-ta. :)

      A história do autógrafo está aqui:

      http://gotaderantanplan.blogspot.com/2009/03/o-autografo-do-artista.html

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  3. Não estás enganada, assim fazem as coisas as pessoas de bem.
    Pessoalmente, sendo filha de uma antiga professora, funcionária pública e irmã de um também funcionário público, acho que digitalizar quaisquer documentos de trabalho que contenham elementos relativos à vida pessoal seja de quem for, só com fotografia ou só com nomes, é uma grave violação dos deveres profissionais. Todos os que trabalhamos na 'máquina' do Estado temos, em virtude das nossas funções, acesso a dados e elementos de cidadãos. Mas como trabalhamos para eles, e exercemos uma função de interesse público, temos também um dever de respeito e reserva pela intimidade e vida privada desses cidadãos.
    Ora os livros de ponto são documentos da Escola, em última instância do Ministério da Educação, pelo que a tal professora não tem legitimidade para se deles apossar e divulgar e, na minha opinião, cometeu uma grave falta disciplinar.
    Por isso, S*, não tens razão. Mesmo. Não é só um livro de ponto, é um registo de uma entidade pública. Se fosse publicado num livro sobre a história da escola, com consentimento do órgão directivo desta, e de todos os reetyratados, não tinha mal. Mas no facebook? Haja senso!

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  4. De todo. Nada enganada. A nossa imagem é isso mesmo: nossa. E só nós temos o direito de decidir onde e como a divulgar. Independetemente de sermos um John Doe que ninguém conhece ou uma figura pública.

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  5. David,
    Eu privarizei o blogue do Liceu quando percebi pelo contador de visitas que aterravam lá pessoas com buscas no Google sobre os nossos nomes. Até o meu, o que é um bocadinho arrepiante. E acontece que nos grupo até há pessoas importantes e em cargos destacados. Mas mesmo que não houvesse, era igual. Aquilo é um espaço nosso e só lá entra quem deixamos. E assim estamos todos à vontade e podemos publicar todas as fotografias dos jantares sem problemas.

    S*,Teoricamente os livros de ponto ndada têm de mal, e até suponho (e espero) que aquilo tenha sido posto num grupo mais ou menos restrito do Facebook. Mas vê o comentário da Izzie, mais abaixo.

    Jonas,
    Pois é, também me parece que não.

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  6. Izzie,
    Na altura nem me detive muito a pensar na questão da professora, o que estava em análise era a atitude de quem ia para o blogue publicar as fotografias e identificava os fotografados, dando-lhes nome "só porque não o liam".
    Mas acho que estás coberta de razão.

    Me,
    Entre os primeiros dos muitos comentários que o post da Izzie já leva há um meu em que conto uas histórias acontecidas comigo que ilustram muito bem o que disseste. Sou uma Jane Joe, é o que quero ser, e na minha imagem mando eu.

    Ana,
    Ainda bem que concordas.

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