quinta-feira, 23 de junho de 2011

I ♥ Gatoso

Na minha rua há uma mercearia pequenina, muito humilde, com ar de antiga taberna. Não tem muito para oferecer: algumas hortaliças, quatro ou cinco qualidades de fruta da época, coisas básicas como leite, farinha, açúcar, algumas massas, azeite. Mesmo assim, tento sempre comprar lá alguma coisa ao fim-de-semana, porque me comove a tenacidade do casal idoso que a mantém, mesmo não dando obviamente qualquer lucro. E porque esse casal idoso protege e alimenta o Gatoso.

O Gatoso, como lhe chamo (o casal da mercearia não lhe deu qualquer nome, para eles é simplesmente o gato), é um bichano velhinho, de rua, cheio de cicatrizes antigas de bravas pelejas dos seus tempos de galã. De uma meiguice de fazer derreter o coração, cumprimenta-me sempre com um miado e estende a cabecinha de pêlo áspero e maltratado às minhas festas com um ronronar de beatitude.

Há tempos, num sábado, por volta da hora do almoço, ao passar em frente da mercearia lembrei-me de que havia vários dias que não via o Gatoso. Entrei para perguntar por ele, com o pretexto de comprar dois pacotes de leite. O casal estava a almoçar, numa mesa improvisada. E larguei a rir, porque nem precisei de perguntar nada. Junto deles, no chão, estava o Gatoso, a receber alternadamente de um e de outro bocadinhos do seu peixe cozido.





Update de 19 de Julho de 2011: soube hoje que o Gatoso morreu. Fiquei desolada. A senhora, quando lhe perguntei por ele, que já não via há uns dias, desatou a chorar e contou-me. Está inconsolável, e ficámos um grande bocado a conversar.

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