Pronto, também vou falar do casamento real
A realeza, digam lá o que disserem, é outra loiça. Exerce sobre nós um fascínio que só não é inexplicável se nos lembrarmos de que aprendemos a ler em livros de contos de fadas em que havia sempre um príncipe encantado e uma encantadora princesa, ou, na outra vertente, uma pastorinha linda como os amores que, depois de duras provações, era escolhida pelo príncipe e juntos viviam felizes para sempre.
A realeza, seja lá como for, responde a um qualquer anseio de sonho e de evasão que continua a existir em nós, a um qualquer resquício da criança que em tempos fomos, a criança que lia histórias que começavam com as mágicas palavras «há muito, muito tempo, no tempo em que os animais falavam...»
E não há realeza mais realeza do que a britânica, não há rainha mais rainha do que Sua Majestade a Rainha Isabel II. Que não tarda nada vai ser a monarca britânica com maior longevidade no trono, ultrapassando a venerada e veneranda Rainha Vitória. E sempre imensamente respeitada. Confesso aqui a minha enorme admiração por esta grande Senhora, espero que Agripininha (que a trata por Auntie Lilibet e que foi convidada para o casamento real, obviamente — linhagem muito mais antiga, é importante lembrar —, não repararam naquela cauda tabby cinza irrequieta por baixo da cadeira de Sua Majestade na abadia?) não se tenha esquecido de lhe transmitir isto.
Tudo isto considerado, a noiva, que é linda, estava linda, e não venham cá as habituais entendidas em moda dizer que estava muito basicazinha, muito simples, que se esperava mais. Queriam o quê? Moulin Rouge meets the Royal Wedding? Cristais Swarowsky profusamente espalhados acima e abaixo pelo vestido? Uma noiva, e ainda mais uma noiva real (não esqueçamos que a agora duquesa de Cambridge poderá vir a ser rainha de Inglaterra) quer-se tapada, discreta, sóbria, com decoro. Braços ao léu são um não-não total, não se trata de uma disco night com as amigas. O casamento é um sacramento, e isto vale tanto para a Igreja Católica como para a Anglicana. E numa igreja, seja qual for a confissão, está-se com respeito e recato. Por falar nisso, vi muita convidada de perna traçada na abadia de Westminster. Não se traça a perna na igreja, joelhos firmemente juntos, não estamos numa esplanada. Confesso que eu e a minha irmã ficámos de olhos em bico quando vimos o filme do casamento dela e topámos uma das suas cunhadas (casada com um diplomata, ainda por cima) de perna traçada.
O vestido era lindo, intemporal, sobreviverá muito mais no tempo do que aquela coisa medonha que a princesa Diana vestiu, num faux pas de pessoa muito novinha. Ele era folhos, ele era laçarotes, ele era tudo excessivo — e muito amarrotado, que a seda selvagem é tramada. A própria princesa viria a odiá-lo, poucos anos mais tarde.
A tiara estava de acordo. Dizem as sempre omniscientes autoridades de moda nacionais que era muito basicazinha. Não, não era. Era a tiara certa para a simplicidade do vestido e para o ar fresco da noiva. A mais modesta de todas as tiaras reais, cedida pela rainha, que a recebeu como presente nos seus 18 anos. E não esqueçamos que este casamento não é casamento de Estado, a noiva casa com o herdeiro do presumível herdeiro da coroa (esta gente não sabe nada de História?).
O penteado? Perfeito. A noiva teve o bom senso de não se desviar um milímetro da aparência diária que toda a gente se habituou a conhecer-lhe. Iríamos estranhar vê-la com o cabelo apanhado — outra asneira que muitas noivas fazem, criando um visual único que acaba por se tornar uma coisa apalhaçada e estranha e que redunda, infelizmente, em ficarem medonhas justamente no dia, entre todos os dias, em que quereriam estar mais bonitas.
A música, essa sim, desapontou-me. Foi impossível não lembrar o outro casamento real (de fim tão triste) de há trinta anos, e Dame Kiri Te Kanawa a cantar Let the Bright Seraphin (que Dame Joan Sutherland, escusado será dizer, cantava ainda melhor).
Apontamentos soltos:
— o «You're so beautiful!», ou coisa semelhante, que o príncipe Guilherme disse à noiva quando ela chegou ao altar. Lip reading, percebi distintamente o adjectivo beautiful.
— O broche da rainha! O broche da rainha! Sempre que a senhora aparecia os meus olhos cravavam-se naquela deslumbrante peça de joalharia.
— O chapéu (lindo, por sinal) da princesa Michael de Kent tinha um diâmetro tal que só pode ter provocado torcicolos aos vizinhos da esquerda e da direita na abadia. E faz-me sempre muita impressão olhar para o marido, a tal ponto parece uma reencarnação de Nicolau II da Rússia.
— A pobre princesa Beatriz não deve muito à beleza. Aquele chapéu (?) não ajudou nada. Para começar, fico intrigada, sem saber como conseguiu prender aquela engenhoca à cabeça. E o pior é que só imagino um espelho naquele espaço central vazio.
— O duque de Edimburgo, que a minha Mãe toda a vida sustentou ser o homem mais arrebatador que já tinha visto (quais estrelas de Hollywood, qual quê, tirando talvez Gregory Peck, que ela adora), quase a cumprir noventa anos, continua um pessegão. Que classe!
— Que pena o príncipe Guilherme ter o uniforme mais feio de todos! Perdia tanto para o do irmão (apesar do excesso de dourados) e, principalmente, para o do pai!
— A duquesa da Cornualha (parem de lhe chamar Parker-Bowles, por amor de Deus!) estava linda. Gosto dela, sempre gostei muito dela, mesmo ainda em vida da princesa Diana. O que esta senhora padeceu não deve ter princípio nem fim. Old loves die hard.
— Não posso embirrar mais com Victoria Beckham. Quando vejo uma mulher grávida empoleirada em saltos daquela altura perco a paciência. Bem sei que Londres não é Lisboa, que o pavimento é outro, mas eu até com saltos muito estáveis passo a vida a tropeçar. A mulher é parva, pronto. Viram a curvatura de vertigem que o pé dela fazia nos Louboutin?
— A irmã da noiva. Linda, sem dúvida. Um vestido de sonho (apesar de só lhe permitir passos muito miudinhos, bem lhe vi a dificuldade a subir degraus). Mas por que raio têm logo de fazer comparações? Não suplantou a irmã (que acho muito mais bonita) nem era essa a intenção. Esteve perfeita. Ponto final.
— Elton John e o marido. Confesso que ainda considerei escrever cônjuge. Mas não. É marido. São marido um do outro. Feliz sinal dos tempos. Um casamento real que convida um casal gay legitimamente casado anuncia novos tempos. Ainda há poucos anos pessoas divorciadas não podiam ser convidadas para os célebres garden parties reais, quanto mais para uma apresentação na corte!
Depois de todos estes considerandos, as minhas noivas favoritas dos últimos cinquenta anos:
Perfeita. Que beleza de vestido! Que toucado encantador! E tudo tão sóbrio, tão adequado à idade! Um amor que atravessou décadas na clandestinidade e que acabou por triunfar. Nem quero imaginar o calvário desta senhora. Penso sempre no romance de García Márquez, O Amor nos Tempos de Cólera (mesmo sendo a persistência o único factor comum)
Máxima da Holanda, definitivamente o meu vestido favorito de todos os casamentos reais. Valentino. A enorme simplicidade de um grande mestre da agulha. A dignidade e a imponência régias de mãos dadas. Perfeição absoluta.
A música, essa sim, desapontou-me. Foi impossível não lembrar o outro casamento real (de fim tão triste) de há trinta anos, e Dame Kiri Te Kanawa a cantar Let the Bright Seraphin (que Dame Joan Sutherland, escusado será dizer, cantava ainda melhor).
Apontamentos soltos:
— o «You're so beautiful!», ou coisa semelhante, que o príncipe Guilherme disse à noiva quando ela chegou ao altar. Lip reading, percebi distintamente o adjectivo beautiful.
— O broche da rainha! O broche da rainha! Sempre que a senhora aparecia os meus olhos cravavam-se naquela deslumbrante peça de joalharia.
— O chapéu (lindo, por sinal) da princesa Michael de Kent tinha um diâmetro tal que só pode ter provocado torcicolos aos vizinhos da esquerda e da direita na abadia. E faz-me sempre muita impressão olhar para o marido, a tal ponto parece uma reencarnação de Nicolau II da Rússia.
— A pobre princesa Beatriz não deve muito à beleza. Aquele chapéu (?) não ajudou nada. Para começar, fico intrigada, sem saber como conseguiu prender aquela engenhoca à cabeça. E o pior é que só imagino um espelho naquele espaço central vazio.
— O duque de Edimburgo, que a minha Mãe toda a vida sustentou ser o homem mais arrebatador que já tinha visto (quais estrelas de Hollywood, qual quê, tirando talvez Gregory Peck, que ela adora), quase a cumprir noventa anos, continua um pessegão. Que classe!
— Que pena o príncipe Guilherme ter o uniforme mais feio de todos! Perdia tanto para o do irmão (apesar do excesso de dourados) e, principalmente, para o do pai!
— A duquesa da Cornualha (parem de lhe chamar Parker-Bowles, por amor de Deus!) estava linda. Gosto dela, sempre gostei muito dela, mesmo ainda em vida da princesa Diana. O que esta senhora padeceu não deve ter princípio nem fim. Old loves die hard.
— Não posso embirrar mais com Victoria Beckham. Quando vejo uma mulher grávida empoleirada em saltos daquela altura perco a paciência. Bem sei que Londres não é Lisboa, que o pavimento é outro, mas eu até com saltos muito estáveis passo a vida a tropeçar. A mulher é parva, pronto. Viram a curvatura de vertigem que o pé dela fazia nos Louboutin?
— A irmã da noiva. Linda, sem dúvida. Um vestido de sonho (apesar de só lhe permitir passos muito miudinhos, bem lhe vi a dificuldade a subir degraus). Mas por que raio têm logo de fazer comparações? Não suplantou a irmã (que acho muito mais bonita) nem era essa a intenção. Esteve perfeita. Ponto final.
— Elton John e o marido. Confesso que ainda considerei escrever cônjuge. Mas não. É marido. São marido um do outro. Feliz sinal dos tempos. Um casamento real que convida um casal gay legitimamente casado anuncia novos tempos. Ainda há poucos anos pessoas divorciadas não podiam ser convidadas para os célebres garden parties reais, quanto mais para uma apresentação na corte!
Depois de todos estes considerandos, as minhas noivas favoritas dos últimos cinquenta anos:
Perfeita. Que beleza de vestido! Que toucado encantador! E tudo tão sóbrio, tão adequado à idade! Um amor que atravessou décadas na clandestinidade e que acabou por triunfar. Nem quero imaginar o calvário desta senhora. Penso sempre no romance de García Márquez, O Amor nos Tempos de Cólera (mesmo sendo a persistência o único factor comum)
Máxima da Holanda, definitivamente o meu vestido favorito de todos os casamentos reais. Valentino. A enorme simplicidade de um grande mestre da agulha. A dignidade e a imponência régias de mãos dadas. Perfeição absoluta.
Bom texto, Teresa, mas não achou um bocadinho faux pas que a madrinha também fosse de branco?
ResponderEliminarConcordo com praticamente tudo. Vamos esperar que as nossas fashionistas tenham reparado que a maior parte das convidadas usava roupa que lhes cobria os braços, e deixem de usar vestidos de alcinhas em casamentos que se realizam em pleno Inverno. É uma coisa que ultrapassa a minha capacidade de compreensão.
ResponderEliminarO único faux pas foi a mãe da noiva não ter levado luvas. A madrinha estava como dama-de-honor e como tal podia (e devia) estar de branco - basta atentar nas fotos do casamento de Carlos com Diana ou da própria Rainha.
ResponderEliminarEstava a ver que não. Não há pachorra para estas pseudo-entendidas de moda que em tempos idos tinham blogs bem giros.
ResponderEliminarEstava a ver que ninguém reparava na estupidez que é uma mulher grávida andar naqueles saltos altos! "A mulher é parva, pronto.", clap clap clap.
ResponderEliminarQuanto às mangas do vestido da noiva: algo me diz que a escolha foi sobretudo prática - para ir numa carruagem descoberta, com este tempo, é o mais adequado.
Quanto aos blogues de especialistas da nossa praça: mais vale esquecer. Parece que o que as move é o prazer de mal dizer.
Boa música, Teresa!
A noiva ia lindíssima, sóbria e muito adequada. A madrinha idem aspas, sem ofuscar coisa nenhuma (o vestido era lindo, nada a dizer).
ResponderEliminarOs Beckam iam de parolos, que é o que eles são. Os saltos dela eram despropositados e de um exibicionismo puro. Estando grávida, então, é um despropósito (gostava de a ver andar naquilo, que disparate). Li no A Literatura que o Beckam levava a condecoração na lapela errada, mas como não percebo nada de "protocóis", não sei... se foi, que faux pas.
A rainha, a minha rica 'zabelinha, ia tão bem. E sim, o broche era lindo, se ela se fartar pode mandar lá para casa.
Ah, a grande alegria que me trouxe a leitura deste post. Sim senhora, Teresa, muito bem dito, ponto final parágrafo.
ResponderEliminarNo entanto opiniões minhas: não gostei de ver a mãe da noiva a:) sem luvas e b:) de cabelo solto com capeline, quando ele fica ao nivel dos ombros.
Gostou de ver a irmã da noiva, está no seu direito, eu não gostei. MESMO sendo parte da entourage,não a acho com idade para usar um branco LONGO no casamento. Gostos... sou mais tradicionalista nisso, pelos vistos.
A noiva estava perfeita. Não há mais nada a dizer (sim, concordo completamente que o vestido da Diana era a coisinha máiiii feia que eu já vi num casamento real)
No entanto gostei da escolha de fatucho do noivo. Mão o achei inferior em beleza ao do irmão. Fica linda aquela mancha vermelha com faixa azul na sacada de Buckingham! Ficam fotos memoráveis. E assim se destaca completamente do look do casal anterior (Carlos e Diana).
A esposa do sr. Prime Minister, sem comentários! Mas senti-me a modos que quase ofendida. Ora um chapeuzinho? Custava?? Ahhh, gente do contra!
Faux Pas do SÉCULO, o exelentíssimo pai da noiva a limpar o SUOR com as MÃOS NUAS, as mesmas que mais tarde distribuiriam os vastos passou-bens da praxe.
But well, plebe is plebe. ahahaha...
Obrigada por este texto, Teresa! Concordo em absoluto.
ResponderEliminarA noiva ia linda, linda. Nunca demasiado básica!
O vestido era deslumbrante e confesso que era exactamente assim que o imaginava, antes da boda. A renda a cobrir os braços, a sobriedade mas, mesmo assim, a acentuar devidamente as formas. Adorei. É intemporal, ao contrário do merengue de Diana, que já não gostei na altura, mesmo estando na idade dos príncipes, princesas e deslumbre pelos vestidos de baile.
O vestido de Máxima também era o meu favorito. Agora, sinto-me dividida.
A irmã é linda mas não vejo como desviou as atenções. Mascarar-se-ia de feia? Ridículo.
Catherine ia linda e com a felicidade estampada no rosto. Nada o ultrapassa.
Gostei da farda de William. O encarnado deu um toque diferente.
Concordo com tudo!
ResponderEliminarFico particularmente contente por encontrar mais uma pessoa que gosta da Camila.
Segundo o protocolo a madrinha pode ir de branco... eu gostei muito da Pipa (estou, tu cá, tu lá com ela!) e soube hoje que os sapatos da Beckham tinham 20cm...uma temeridade!!!
Resumindo: adorei esta festa.
xx
Acho que és a primeira pessoa que "oiço" a elogiar a Camila. De facto, um romance digno de lembrar "O Amor em Tempos de Cólera".
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