quarta-feira, 4 de junho de 2008

Mixed blessings... ou a cabra da porteira

Obrigada, muito obrigada a todos os que me deixaram aqui comentários ou enviaram e-mails com votos de que eu conseguisse o que tanto desejava, mesmo sem saberem o que fosse.

Era uma casa, meus amigos. Era uma casa encantadora, mesmo feita à minha medida. Era uma casa com a minha cara. Mas cheguei tarde.

Tenho andado à procura de casa. A disponibilidade para tal é quase nula e, na maior parte das vezes, acabo a amaldiçoar os malabarismos com o tempo a que me vejo obrigada para ir ver um tugúrio indescritível. Isto para não falar em preços... A audácia de certas pessoas não conhece limites! No domingo vi uma casa que me deixou dividida entre a vontade de ter um ataque de riso, um ataque de choro... ou enfiar a cabeça do proprietário na retrete e puxar o autoclismo — rezando para que ele funcionasse, e tenho cá as minhas dúvidas.

A melhor coisa que tinha era o chão, recém-afagado e envernizado (de taco de pinho do mais reles). As paredes (como vê foi tudo pintado, dizia o cromo, todo ufano) tinham levado uma lambuzadela superficial e pouco uniforme, e o lema deve ter sido mesmo cortar nos gastos, fita adesiva incluída, porque os interruptores e as tomadas também tinham sido liberalmente beneficiados com tinta... Fui à varanda, só para verificar que faltava um bocado do parapeito; a parte sobrevivente do dito fez-me lembrar num sobressalto que tenho de fazer o rappel da vacina do tétano, tão ferrugenta estava. Abri um dos armários da deprimente cozinha, a porta oscilou e uma das dobradiças quase saltou. Puxei um estore, subiu uns dez centímetros na diagonal e estacou para não mais se mexer. Eu não fazia comentários, só pensava com os meus botões que aquela casa se enquadrava mais em Asunción, capital do Paraguai (não deve haver país mais rasca), do que em Lisboa. O cromo fez-me notar que até tinha baixado a renda em cinquenta euros, o anterior inquilino pagava 600, e antes dos melhoramentos. Eu já estava por tudo, aquilo era desplante a mais. Encolhi os ombros e fui malcriada, paciência. Ele há doidos para tudo. Boa tarde.

Saio do prédio e vejo mesmo em frente (prédio com muito bom ar) escritos em três janelas do segundo andar. Hum... Deviam ser pelo menos quatro assoalhadas, eu só queria três... Ainda assim... Abri o portão — tinha um pedaço de jardinzinho muito bem cuidado antes da entrada, recuada uns metros em relação aos restantes prédios — e vai de tocar a campainhas, até alguém aparecer a uma janela e me informar de que quem tratava do assunto era o rés-do-chão A. Toquei e toquei. Nada. Voltei uma hora mais tarde. Nada. Voltei já por volta das oito horas. Nada.

Ontem, ao vir para casa, tarde como sempre, mesmo já estando com uma outra casa, de que tinha gostado bastante, praticamente garantida, lembrei-me de lá ir. A porteira abriu-me a porta. Calorosa e comunicativa. Querem saber? Tinha acabado de prometer a casa! A pessoa tinha saído dali não havia dez minutos. Ai, se eu tivesse saído do Colosso uma hora mais cedo!!! Ai, se a cabra da porteira não tivesse estado na véspera no baptizado do sobrinho-neto no Fogueteiro!

Fiz a maior asneira de todas: pedi para ver a casa, mesmo assim. Antes não o tivesse feito, não estaria agora com esta enorme vontade de chorar. Impecável! Tudo pintado de novo. Chão de taco, encerado, muito bonito. Luz, luz, luz. Uma cozinha óptima, reluzente e cheia de arrumação. A casa de banho não era ideal, as loiças podiam ser melhores, mas era muito simpática e tinha janela para as traseiras. Um quarto pequeno ao lado da cozinha (escritório, destinei mentalmente). Outro quarto a seguir, de bom tamanho, um convidativo vão na janela, mesmo a pedir prateleiras para livros, seria o santuário para as minhas noites de sono, cada vez mais curtas. Duas salas ligadas por um arco - salas de estar e de jantar, estava-se mesmo a ver. Não tinha roupeiros, mas a antiga despensa tinha sido transformada num fantástico closet. A casa não podia ser melhor — a não ser que tivesse lareira. A renda? A renda? QUINHENTOS E VINTE CINCO EUROS!!!

Hoje telefonei algumas cinco vezes à cabra da D. Conceição, a cabra da porteira (que debalde — ao menos que me reste a alegria de recorrer a este advérbio! — tentei subornar sensibilizar para a minha causa), a cabra da porteira D. Conceição é senhora de palavra. Deixei-lhe o meu cartão, ficou muito impressionada e roída de remorsos. Cabra! Amorosa! A cabra que chegou antes de mim ia hoje sinalizar. Podia acontecer qualquer coisa: mudar de ideias (boa piada), aparecer-lhe uma casa melhor (extraordinária piada)... o cheque não ter cobertura... Soubesse eu quem a grande cabra era e de onde ia, teria sido pequena para a passar discretamente a ferro com o carro.

E pronto, meus amigos. Foi assim. Amanhã assino o contrato da outra casa, que agora já me parece menos apetecível, muito menos apetecível. Passei lá há pouco, a caminho de casa. Fiquei aterrorizada: ainda estou para descobrir onde raio hei-de deixar o carro. Mas tem uma varanda. Pinxejas adoram ter uma varanda. E eu posso pôr lá a bandeira nacional, que temos o Europeu ao virar da esquina. E tem um canteiro, uma floreira... ou como raio se chama aquele coiso de pedra com terra, para eu ter renovadas experiências desastrosas com plantas. Nem tudo é mau....

Seja como for, se alguém por aí tiver uma casa fantástica para me sugerir antes da hora do almoço de amanhã (assinatura de contrato)... eu largo tudo e vou a correr. Bem sei que é um dia complicado no Colosso, mas isso são outros quinhentos...

Banda sonora: Byrds - Turn Turn Turn

P.S. Assomo tardio de consciência, que continuo de cabeça perdida, cheia de vontade de chorar, mas sou muito escrupulosa: nas respostas que dei a alguns dos carinhosos mails que recebi... não era bem cabra que eu chamava à porteira. E toda a gente sabe que eu odeio palavrões...

8 comentários:

  1. Tadinha. Fiquei tristíssima. Mas deixa, vai aparecer outra melhor ainda, vais ver.

    Um dos meus desportos preferidos quando morava em Lisboa era ver casas para alugar ao fim-de-semana. Deve ter sido por isso que, em cinco anos, mudei seis vezes...

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  2. Enfim...
    Deixe lá, melhores dias virão e quiçá, uma casa cheia de luz, numa outra altura!
    Agora é seguir em frente!

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  3. Pensa que talvez nessa nova casa Sua Majestade Messalina já não te obrigue a passar meia hora debruçada num parapeito em vãs tentativas de suborno (tenho pena, pois convenhamos que a cena foi divertidíssima ;).

    Vais ver que depois de 'ajeitada' a teu gosto a casinha vai ficar um must! E até te dou umas dicas de jardinagem, se quiseres!
    Beijocas e esquece a outra casa.

    PS: mas compreendo o teu desânimo: eu gostava de ter um tórrido romance com o Jon Bongiovi, mas parece que também houve quem chegasse primeiro...hélas!

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  4. A mim também me cheira que vai aparecer outra melhor. Podes sempre mudar daqui a uns meses?

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  5. Porque não esperar um pouco? É que as aulas da faculdade estão a terminar agora, muitos alunos estão a terminar o curso e a regressar às suas terras no verão logo irão vagar outros apartamentos em lx. Não te precipites assim se estás triste com a nova casa. Beijinhos.

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  6. Bah... se calhar tinha esqueletos no closet, almas penadas na casa de banho e uma família inteirinha enterrada no jardim bem cuidado (para disfarçar, claro). Esquece... o que "não tem de ser" tem muita força!

    beijinhos

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  7. Pois...
    Alguma coisa tinha de errado com a tal casa pretesamente perfeita e minhas orações vao agora pra que sejas muuuito feliz na outra :)

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