What goes around...
... comes around. Ou, numa das várias traduções possíveis, quem com ferros mata, com ferros morre. É o que diz a sabedoria popular, pelo menos. Na história que agora conto, assim parece ter acontecido.
Dory Previn, de quem falei ontem, era casada com o famoso compositor e maestro André Previn (treze nomeações para o Oscar, quatro vitórias). Felizmente casados, ao que parece. Uma boa parceria criativa. As canções dela, de resto, tiveram também três nomeações para o Oscar.
O casal tornou-se amigo de uma actriz muito nova e de ar frágil, que já trazia no activo um casamento (aos 21 anos) com Frank Sinatra, então com 50. Um belo dia (ou talvez não), a jovem actriz apareceu grávida... justamente do marido da amiga. O casamento acabou, a jovem actriz saiu vitoriosa da disputa, casou com o maestro e deu à luz gémeos, juntos tiveram ainda outro filho, adoptaram mais três crianças, duas vietnamitas e uma coreana, Soon-Yi.
A história poderia ter ficado por aqui. Mas já Shakespeare, extraordinário conhecedor da natureza humana, dizia que não há nos infernos fúria comparável à de uma mulher desprezada. A jovem actriz feriu de morte uma mulher que escrevia canções, hábil no manejo das palavras. Em 1970, o ano em que todo este turbilhão de acontecimentos teve lugar, Dory Previn editou o seu primeiro álbum a solo, On My Way to Where. E gritou aos quatro ventos, numa canção, para quem quisesse ouvir, tudo o que se tinha passado. A canção é esta, Beware of Young Girls.
Os anos correram, atrás desses anos vieram outros. O casamento do maestro com a jovem actriz durou nove anos, depois separaram-se. Amistosamente. O maestro ainda viria a casar mais duas vezes, a última da quais com a grande e aclamadíssima violinista Anne-Sophie Mutter (divorciaram-se em 2006, quem será a próxima?). A jovem actriz, já um bocadinho menos jovem, não voltou a casar. Iniciou uma longa relação com um também aclamadíssimo realizador de cinema. Cada um vivia em sua casa, mas tiveram um filho e adoptaram mais dois juntos (and counting). E depois, em 1992, rebentou o grande escândalo. O aclamado realizador de cinema tinha-se apaixonado pela filha adoptada da jovem-actriz-já-não-tão-jovem-como-isso e do célebre maestro, Soon-Yi. O agregado familiar desfez-se muito dolorosamente. Soon-Yi e o aclamado realizador viriam a casar em 1997, cinco anos depois. Continuam juntos, adoptaram duas crianças. A jovem actriz de toda esta tragédia quase grega chama-se Mia Farrow. O aclamado realizador (que, mesmo para os mais novos, dispensa link) é Woody Allen.
Justiça poética? Não sei, não faço ideia. De resto, não acredito nada, nunca acreditei, nessa frase odiosa, sempre brandida com uma entoação a puxar para o chinelo, aquela coisa de cá se fazem, cá se pagam. Quis apenas contar uma história e gostaria de a ter contado bem. Mas é impossível não me lembrar de uma outra frase herdada da infinita e inesgotável sabedoria popular: as mós de Deus moem devagar, mas moem finíssimo.
Beware of Young Girls | ||
Beware | She was my friend | |
Of young girls | My friend, my friend | |
Who come to the door | I thought her motives were sincere | |
Wistful and pale | Oh yes, I did | |
Of twenty and four | Ah but this lass | |
Delivering daisies | It came to pass | |
With delicate hands | Had a dark and different plan | |
She admired | ||
Beware | My own sweet man | |
Of young girls | She admired my own sweet man | |
Too often they crave | ||
To cry at a wedding | We were friends, | |
And dance on a grave | Oh yes, we were | |
And she just took him from my life | ||
She was my friend | Oh yes, she did | |
My friend, my friend | So young and vain | |
She was invited to my house | She brought me pain | |
Oh yes, she was | But I'mm wise enough to say | |
And though she knew | She will leave him | |
My love was true | One thoughtless day | |
And no ordinary thing | She'll just leave him | |
She admired | And go away | |
My wedding ring | Oh yes | |
She admired My wedding ring | ||
Beware | ||
She was my friend | Of young girls | |
My friend, my friend | Who come to the door | |
She sent us little silver gifts | Wistful and pale | |
Oh yes, she did | Of twenty and four | |
Oh what a rare | Delivering daisies | |
And happy pair | With delicate hands | |
She inevitably said | ||
As she glanced | Beware | |
At my unmade bed | Of young girls | |
She admired my unmade bed | Too often they crave | |
My bed | To cry at a wedding | |
And dance | ||
Beware | On a grave | |
Of young girls | ||
Who come to the door | Beware of young girls | |
Wistful and pale | Beware of young girls | |
Of twenty and four | Beware | |
Delivering daisies | ||
With delicate hands | ||
Beware Of young girls | ||
Too often they crave | ||
To cry At a wedding | ||
And dance On a grave |
Bem, que história! No meio dela, só não conhecia mesmo a Dory. O André Previn conheço, pois tenho uma Bela Adormecida conduzida por ele, que não é propriamente fantástica, mas não está má.
ResponderEliminarPedro,
ResponderEliminarTambém a tenho. Adoro Tchaikovsky.
Pois, digamos que que é o meu compositor preferido, se é que pode haver preferências nestas coisas. E até podia ser uma preferência tendenciosa, por causa do ballet, mas vai muito mais além.
ResponderEliminarBoa história, Teresa. Não conhecia a Dory nem as canções dela (shame on me...).
ResponderEliminarLembrei-me, com esta história, de um filme extraordinário da grande Bette Davis: All about Eve. Um bom exemplo de que a inexorável passagem do tempo tudo compensa e tudo equilibra.
Um dia destes conto-lhe aqui, publicamente, um segredo. O da peça de música que mais desgarradoramente consegue fazer-me chorar (pronto, talvez empatada, ex-aequo, com duas coisas de Bellini). Mas é dele, de Tchaikovsky.
ResponderEliminarAna,
ResponderEliminar:)
Outro "filme da minha vida"...
Romeu e Julieta;
ResponderEliminarCasta Diva;
e falta-me a terceira de Bellinni... que assim de repente... não estarei a ver! Bem, posso já ter-me enganado nas outras duas!
Pois foi, Pedro, pois foi.
ResponderEliminarConfesso que há muito tempo passo por cima da Casta Diva, esgotei-a. Mas andou muito perto. São várias coisas da Norma, sim. Oh Rimembranza, Mira o Norma (sempre, sempre, sempre nas extraordinárias vozes da imensa Dame Joan casada com a fabulosa Marylin Horne) e o arrepiante Qual Cor Tradisti. E depois, claro... também de Bellini, Ah, Non Credea Mirarte, da Sonnambula. Choro, continuo a chorar baba e ranho com todos.
Só não revelo a de Tchaikovsky. E não é ballet.
Estava a pensar no non credea mirarte. Se não é o Romeu e Julieta, só pode ser a 6ª!
ResponderEliminarNope...
ResponderEliminarA maravilhosa Norma também me comove, Teresa. Só uma pedra resistiria...
ResponderEliminarHummm. Desisto! Corro o risco de parecer patético, se me puser a fazer listas!
ResponderEliminarRefiro apenas que os que referi são algumas das que mais me comovem. Porque nalguns aspectos prefiro continuar a ter 15 anos.
Ah, e já com blóguio!
Teresa e Pedro, sorry lá meter-me no meio do vosso tête-a-tête, mas eu tinha que deixar aqui o meu rast(r)o:
ResponderEliminaró Teresa, só tu para saberes esta história toda, caramba!
Uma coisa é certa, a Mia Farrow, tem um gosto super duvidoso para homens. hihihihihi
ResponderEliminarbeijo d'enxofre
kkkkkkkkkkk... ou escolhe mesmo pelo intelecto, era o que estava a pensar quando dei aqui com a perversa a pensar o mesmo...
ResponderEliminarAll About Eve é fantástico e de quebra traz a Norma Jean antes de vivar bomb shell.
Olha que tb eu desconhecia esta história da poor Dory... que sina, tadinha, mas mandou ali tamanho spell na jovem pálida que continuou cada vez MAIS pálida, valha-me Deus!!!
BTW::: o tal ditado aqui nas Américas é dito assim: "Quem com ferro fere, com ferro será ferido" adoro esses nossos jeitos diferentes de falarmos o mesmo, com graça particular...
ResponderEliminarBTW::: o tal ditado aqui nas Américas é dito assim: "Quem com ferro fere, com ferro será ferido" adoro esses nossos jeitos diferentes de falarmos o mesmo, com graça particular...
ResponderEliminarWhat goes around... comes around... well I hope so ;)
ResponderEliminarbeijo grande...
um dia explico... talvez ;)
maria
Não acredito em justiça... poética ou não. Acredito que a vida dá muitas voltas e temos que saber aproveitar todas elas.
ResponderEliminarBeijinhos
Não conhecia o início da históri, que sempre achei assaz esquisita. A frase das mós também é nova para mim...e adapta-se na perfeição a situações que tenho presenciado ultimamente. Costumo dizer " O Diabo faz a cobrança mais cedo do que julgamos" mas quando a justiça demora, é geralmente sinal que o castigo não vai ser bonito. Que vergonhaça para a Mia...*bem feito*
ResponderEliminarSissi, a frase das mós encontrei-a num livro de Agatha Christie, e calou fundo.
ResponderEliminarQuanto às pessoa envolvidas nesta história, e são muitas, porque a coisa depois correu nos tribunais, com disputa do poder paternal do filho biológico do casal e acusações de comportamentos indecorosos do pai, nem sei se foi bem feito. Houve muito sofrimento à mistura. Demasiado. E que sabemos nós, que estamos de fora?