sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Lido por aí...

Detesto ter de me explicar, e não vou explicar coisíssima nenhuma. Graças às buscas parvas do Google e à(s) insana(s) criatura(s) que insiste(m) em vir aqui à procura de "Ana Zanatti nua" (coisa que até já deu post) encontrei há tempos um blogue a que não dei suficiente atenção, Lésbica: Simples ou com Gelo? Hoje detive-me a lê-lo mais demoradamente.

O meu ódio ao preconceito é coisa muito antiga. Tenho amigos gays, nunca me dei com lésbicas. Por razões que escapam à minha compreensão, parecem não gostar muito uns dos outros. Podia contar aqui uma história divertidíssima de um grande amigo meu (gay), coroada por uma frase daquelas de passar ao bronze, mas não o farei - é preconceituosa e embarca no chavão. Aos vinte anos ia com frequência a um bar da zona do Príncipe Real cujo nome não refiro, acho que ainda existe. Na gíria dos iniciados era A Emília (nome da senhora à entrada). Entrava lá por especial favor, basicamente era a única mulher entre quatrocentos homens. Encontrei lá de tudo. Colegas de faculdade, namorados de amigas, pais de amigas; todos, mas mesmo TODOS, ficavam verdes quando me viam (UMA GALINHA!), vinham entreter-me com conversas em que eu fingia acreditar (ia aqui a passar, ai que giro, não sabia que havia aqui um bar, vamos lá ver como é...). Só entrava na Emília quem era da casa, eu era admitida porque era amiga de um menino (um dos homens mais bonitos que conheci em toda a minha vida, casado e com duas filhas) que lá... era da casa. E devo dizer-vos que me divertia como uma doida. A começar nas casas de banho... Uma tinha o clássico letreiro "HOMENS", na outra, alguém tinha substituído o "SENHORAS" por... "OPERADAS".

Não quero dispersar-me, teria muitas histórias para contar. Estes foram anos alegres, tontos, inconsequentes. Demasiado tudo isso. Depois veio 1983 e aquela maldita doença que veio mudar tudo. Assisti desde muito cedo aos seus efeitos devastadores e assassinos. Perdi pessoas. Era inevitável o que está hoje a acontecer: a doença, mais tarde ou mais cedo, começaria a reflectir os números reais - hoje a população heterossexual é a mais afectada. E nem é que seja tão mais vasta do que a homossexual, é apenas que é mais estúpida. Os meus amigos gays há mais de 25 anos que são de um cuidado mórbido-a-roçar-a-obsessão.

Tudo isto para chegar a esta leitura, que vai desde já orgulhosamente para os meus links. Não me parece que tenha de vos dar conta da minha sexualidade, mas talvez seja útil saberem que sou, sempre fui e serei completamente heterossexual. Gostei especialmente deste texto, por muitas vezes mentes esclarecidas me terem feito a mesma pergunta boçal no único campo que conheço bem: o da homossexualidade masculina. Qual é a mulher?

ODEIO (ai, nem sabem quanto!) perguntas imbecis deste jaez. Lembro-me sempre de uma coisa que o meu amigo Nuno, que morreu há um mês e era total e devotadamente heterossexual, me disse uma vez e calou fundo: Deus não anda a espreitar os quartos das pessoas.

Pois não. Deus não anda a espreitar os quartos das pessoas.

Aqui fica (espero que as autoras do blogue não se importem) o texto, retirado do blogue Lésbica: Simples ou com Gelo?

O Homem da Relação!

Perguntavam-me muitas vezes quem era o homem da relação. Cansei-me de explicar que era mulher e que tinha relações com mulheres, logo o homem da relação não existe. Compreendi que este tipo de explicação não serve a quem pergunta, simplesmente porque não o entendem, é como tentar explicar o vento a quem nunca o sentiu.


Agora simplesmente agarro-me ao estereótipo de género e vou dando exemplos ilustrativos.

Eu sou quem cozinha (até bolos faço). Ela quem arruma a cozinha.
Eu tenho o ar mais “desportivo”. Ela não prescinde dos vestidos e dos saltos.
Ela tem a panca das motas e da condução. Eu ainda não sei estacionar.
Ela joga bem quase tudo. Eu não sei chutar uma bola.
Ela tem medo de insectos. Eu tenho medo da condução dela.
Eu tenho a caixa das ferramentas. Ela é quem abre os frascos em casa.
Ela tem mais olho para a decoração. Eu sou quem gosta de ir às compras para a casa.
As duas: vemos jogos de futebol; perdemos horas nas compras; jogamos playstation; maquilhamo-nos; passamos a ferro; arrumamos a casa; solucionamos problemas informáticos…
Nenhuma: cospe para o chão; cose botões; faz renda; arranja canalização; mete-se em lutas; ou tem ataques de ciúme…
E na cama, pois na cama, vale tudo menos tirar olhos.

E agora quem é o homem da relação?

12 comentários:

  1. Está um texto muito esclarecedor! Tenho uma amiga lésbica e nunca a ouvi falar mal dos gays (homens).

    Vou linkar o blog no Inferno!

    beijos d'enxofre

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  2. É por estas e por outras que venho cá diariamente!

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  3. Eu tambem sou franca que nunca ouvi falar de atritos entre lesbicas e gays. Mas parece-me que e' estereotipar um pouco as relacoes.

    Creio que nem nas relacoes heterossexuais ha mais distincao entre o tipico papel de homem e de mulher. Digo-te ja que entre os casais amigos mais chegados eu vejo que:

    - Em media a mulher tem mais educacao que o homem.
    - A mulher ganha mais que o homem
    - A mulher trabalha mais que o homem
    - A mulher conduz melhor que o homem (esta e' escandalosamente verdade para TODOS os casais)
    - A mulher cozinha muito pior que o homem
    - A mulher e' mais "sexual" que o homem
    - A mulher percebe igualmente de computadores, programacao e engenhocas, mas acaba por ser sempre a ela a quem cabe sintonizar o DVD e mudar as lampadas

    Mas todos se entendem bem... Os homens tem muitas coisas excelentes agora que nao tinham ha anos atras - apoiam a mulher, tomam-na em consideracao para tudo, dao banho ao cao, ajudam nas tarefas da casa e sao gente super interessante e inteligente com quem ter conversas e' um prazer... e nao os retrogrados de antigamente.

    O papel dos sexos evolui em todos os sentidos, em todas as relacoes.

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  4. Teresa - esqueceste-te o link de onde tiraste o texto. Nem o nome do blog mencionaste para procurarmos nos links do lado.

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  5. tenho imensos amigos homosexuais, mais homens e umas quantas mulheres e, francamente, nunca me tinha ocorrido essa do "quem faz o papel do do sexo oposto". para mim, é óbvio que são os dois do mesmo sexo.

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  6. Gata Verde,
    O meu amigo era uma pessoa muito especial. E é uma grande frase, não é verdade?
    Beijoca!

    Diabba (Possum!),
    Nunca me dei com lésbicas (apenas porque nunca calhou, claro!), mas sei que eles não resistem a fazer troça delas, ou pelo menos do estereótipo cretino da lésbica, género ombros de lenhador, cabelo muito curto e ar de camionista). Em Key West, na Florida, fui ver um show de travesti (fabuloso!), era véspera de furacão e já era a única coisa aberta. Havia dois três casais de lésbicas na sala e eles fartaram-se de lhes dar piadas de mau gosto. Também me arrastaram para o palco (só havia mais um casal heterossexual presente) para lhes mostrar o aspecto que uma mulher devia ter. Eu ia morrendo de vergonha, o Victor (bastard!) ria como um perdido.
    Beijo grande!

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  7. Pedro,
    Muito obrigada pelas palavras, mesmo sendo eu pouco merecedora delas. Julgava-o desaparecido! (sei que ainda tenho um comentário seu por responder, lá para trás...).
    Um beijo.

    AEnima (Possum),
    O teu comentário dava um grande post!
    Obrigada por me chamares a atenção para a ausência de link, corrigi logo! Que estupidez da minha parte!
    Beijo grande.

    TCL,
    Para nós é óbvio, sim, graças a Deus. Infelizmente, há muitas mentes "iluminadas" que ainda fazem perguntas desse calibre. Eu estava habituada a ouvir a pergunta em relação aos meus amigos gays, nunca me tinha ocorrido que o equivalente devia ser uma fatalidade para as mulheres. Daí ter achado o post tão bom.
    Um beijo.

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  8. ol� teresa!
    regressados de f�rias estamos a p�r a leitura em dia e deparamos com este excelente texto.
    N�s que somos dados �s "coisas" do cinema, fomos obrigados a recordar "As L�grimas Amargas da Petra Von Kant", ou os filmes do Robert Von Ackeren... mas regressando ao assunto em quest�o, o que interessa acima de tudo numa rela�o, seja qual for o g�nero, � o amor, simplesmente o amor e nele n�o h� dominados nem dominadores, apenas duas pessoas que se amam.
    beijinhos e continua�o de bons posts.

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  9. O mais importante do post é a questão da Sida: há que ter a consciência das principais vítimas, gentes do Norte, que não são a comunidade gay ( primeira descoberta )nem a heterossexual ( posterior descoberta ), mas os pobres do Sul ( definitiva descoberta! )! Ao menos, vamos lá a fazer- lhes justiça!

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  10. Rui e Paula,
    Sejam bem-vindos, nesse regresso de férias! Tenho lido o vosso blogue aos bocados, sempre tantas coisas tão interessantes e tanto para comentar! Acho que vocês têm ali um trabalho notável de qualidade.
    Beijo amigo aos dois.

    A4,
    A questão da sida é importantíssima e concordo contigo quanto ao horror que é a sua incidência brutal em países africanos.
    Mas o que está aqui em causa é outra questão: os estereótipos, os malditos estereótipos - que nascem de preconceitos absurdos que há que extirpar.
    Um beijo. Tens andado muito arredado!
    Eu também, bem sei... vamos ver se amanhã te faço uma visita.

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  11. "É por estas e por outras que venho cá diariamente", disse alguém lá em cima. Pois. E eu vou passar a vir.

    Grande parte dos meus melhores amigos são gays/lésbicas. Grande, grande, grande texto.

    (como vês, estou a ler de cima para baixo)

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